TOC DE CACHORRO
Erivelto
Reis
Antes de qualquer coisa: não é “tosse
de cachorro”! É TOC mesmo. Agora vamos ao texto.
Coitado de quem não tem boas
lembranças para contar. Eu tenho, mas não sou bom de contá-las. Gosto mais das
memórias inventadas... Essas marcam muito e me dispensam do trabalho de
lembrá-las ou de explicá-las. Permitem-me até melhorá-las. No entanto, adoro
contar as boas lembranças dos outros. O que ouço ou imagino ter ouvido. Às
vezes, conto também as histórias não tão boas. Tal e qual o que se passa quando
se conta com as pessoas...
Tenho um amigo metido a psicólogo e
a veterinário que exerce uma espécie de antropopsicologiaveterinária.
Comparando gente com cachorro – atitude na qual não é o único – mas na qual tem se esmerado bastante. Diz o “cientista
postulante”:
– Tem gente que tem TOC de cachorro. Esse
transtorno obsessivo compulsivo que faz com que as pessoas façam repetida,
inexplicável e/ou inconscientemente o mesmo gesto. Tendo ou não função prática.
Com controle ou sem.
– É mesmo?! Como é isso?
– Já observaram os cãezinhos?! Não abandonam quem não os
trata bem. Antes, são abandonados. Rosnam para a própria sombra, latem e uivam
para a lua. Agitam-se se estão felizes, se arrepiam se levam susto ou se se
preparam para o ataque.
– Os cachorros fazem isso! Ok. Mas, e as pessoas?!
– Também!
E continua meu amigo:
– Outro dia observei um cachorro que
corria atrás de carros e motos latindo, rosnando, arranhando e ameaçando
morder. Localizei logo o seu objetivo: mostrar que mandava no território. E
mostrava a quem passava; a quem não estava nem aí. Bastava que alguém parasse e
se detivesse observando a presença do animal para que ele ficasse estático,
intimidado e confuso.
– Me perdi. Insisto...
– TOC de cachorro é isto! – Diz ele.
E esclarece enumerando:
– “Ficante” de “pegação” na esquina da sombra; gente que
busca o sonho, o consegue e não sabe o que fazer com ele; companheiros que não
cumprem o trato e te “mordem” por instinto –, mas te avisam. Enforcadeira
invisível a cercear espaço. Histórias e mais histórias que não se cruzam...
– Filosoficamente anticanino! – Aplaudo, me divertindo. Ele
continua. Sustentando a metáfora:
– Perceba que os cachorrinhos que correm atrás dos passantes
ou dos carros que os transportam, podem até assustar a um passante mais atento,
como assustaria qualquer palpável e invisível repentina rajada de vento. Mas
não conseguem nada. Assim como as bolotinhas de Bombril que uma babá colocasse,
como se monstrinhos fossem, para assustar criança tímida, indefesa e doce. Produzindo,
assim, a milésima segunda e a milésima terceira utilidades do Bombril: fazer
maldade e cuidar da “recreação” infantil.
– Que conversa?!
– Não, cara, minha tia fazia isso quando trabalhava em casa
de família. Mas a teoria do TOC de cachorro é minha.
“Família de inventores” – Penso.
– O cachorro indeciso, diante do carro parado, e o sonho possuído
e não usufruído são partes de uma teoria que compara os homens aos cães?!
– Você é sábio! – Me diz ele, triunfante, com mal disfarçada
emoção.
– Agora já posso explicar
o capítulo da tese que aborda a fidelidade durante o cio e os postes nos blocos
de carnaval...
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