rio de janeiro,
menos 20 graus.
os patinadores cavalgam parelhos no espelho de gelo da lagoa.
o cristo redentor,
quase irreconhecível
assim,
com a neve cobrindo-lhe
o dorso das mãos pés braços ombros cabeça...
não fosse a justa localização e tamanho
poderia se suspeitar que fosse outrem ali:
um king-kong petrificado no apogeu da escalada;
uma esfinge, de pé, propondo a pantomima do seu enigma;
a estátua da liberdade − renunciando à tocha,
os braços semi-erguidos como asas, livre;
quiça a torre eiffel obesa
ou mesmo um patético espantalho gigante afugentando o sol...
a neve tomba sobre a cidade.
queda lentamente escorada pelo absoluto silêncio,
este silêncio hibernado há mais de quinhentos anos,
lapidando as hélices dos flocos
para o desbunde branco.
casais sobre esquis descem o pão de açúcar.
na baía de guanabara um pai puxa o filho no trenó.
pinguins aplaudem a aurora boreal no posto 9.
vai mesmo que o pau-brasil cisma desbotar na polônia
e uma ave gargarejar na rússia.
uzbequistão e suas palmeiras do mangue...
sibéria 40°...
hoje,
aqui,
são as neves de março que fecham o verão.
e promessa nenhuma.
nunca mais.
MICHEL MELAMED − in regurgitofagia, pág.105 − Ed.Objetiva
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