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Erivelto Reis - Poemas e Crônicas
Quem sou eu

- Erivelto Reis - Poemas e Crônicas
- Poeta - escritor - cronista - produtor cultural. Professor de Português e Literaturas. Especialista em Estudos Literários pela FEUC. Especialista em Literaturas Portuguesa e Africanas pela Faculdade de Letras da UFRJ. Mestre e Doutor em Literatura Portuguesa pela UFRJ. Nascido em Goiás, na cidade de Rio Verde. Casado. Pai de três filhos.
sábado, 31 de maio de 2025
Poema: "Sem rumo", de Erivelto Reis
sábado, 17 de maio de 2025
Poema: "Reels", de Erivelto Reis
Reels
Erivelto Reis
Lá em casa colocamos
Os cachorros pra dormir na sala
Lá em casa respeitamos e debochamos
Da hierarquia das árvores genealógicas
Mas criamos lendas a respeito delas
Lá em casa embaralhamos
Os discursos na mesa de jantar
Catar piolho era uma forma de carinho
E chineladas, uma forma de educar
Lá em casa todo mundo é santo
Desses de não ocupar lugar
Em andor em capela e em altar
Lá em casa sempre falta espaço
E todos os traumas são silenciosos
Lá em casa temos medo
De perder-se qualquer um de nós
Mesmo o mais preguiçoso,
Mesmo o mais avarento
Lá em casa quem sai não volta
Lá em casa quem está não sai
Vira retrato na parede,
Foto esquecida num álbum
Olhar de mãe, piada ruim de pai
Varremos as mágoas pra debaixo do tapete
Que serve de cama e canil pro cachorro
Exemplo de pedagogia
Tácita, não escrita e soberana
De um código familiar
Que transforma ao mesmo tempo
Toda reunião em festa
Todo momento em solene
Desses que viram post, reels, memória e meme
sexta-feira, 28 de março de 2025
Poema: "Crocodilo", de Erivelto Reis
Crocodilo
Erivelto Reis
Porque professor,
Porque proletário,
Porque contratado,
Porque temporário,
Intimidado,
Desvalorizado,
Precarizado...
Porque inconformado,
Porque explorado,
Porque assalariado,
Assediado,
Silenciado...
É que, quando eu posso,
Eu ponho os pingos nos is!
Eu boto o dedo na ferida,
Eu chuto o balde,
Eu soletro os nomes,
Eu parto pro debate,
Eu furo a panela da intriga.
Porque sei onde o problema habita,
Porque sei do oco da marmita,
Porque sei do rombo do consignado,
Porque sei da extorsão do banco,
É que não caio na lábia do sacerdócio.
É que não vou na onda do mártir,
É que não vou bancar o santo.
Porque sei o quanto odeiam meu descanso,
É que não vou baixar a crista
Quando alguém vier cantar de galo,
Quando um raso louvar o atraso,
O proselitismo, o niilismo,
E achar que é prosaico pisar no meu calo.
Porque professor eu sei que não sei de tudo,
Mas sei reconhecer o que é precário,
O que é precarizar com rubricas e semântica,
Porque sinto na pele o peso dessa arrogância.
Percebo o que é covardia, o que é absurdo.
Sei que adoram precedentes,
Realocação de verbas e ausência de licitações,
Crachás e broches hierarquizantes,
Enquanto flanam longe do chão da escola,
Ciosos de seus cargos e de suas comissões.
E enxergo a falha épica em seus discursos,
As suas lábias e as de seus pupilos,
Enquanto esperam que eu cale...
Enquanto esperam que eu seque
As suas lágrimas de crocodilo.
Eis o ápice de seu cinismo.
segunda-feira, 3 de março de 2025
Crônica: "Uma indústria sexista e etarista", crônica de Erivelto Reis
Uma indústria sexista e etarista
Erivelto Reis
A Academia norte-americana de cinema que já vem demonstrando grande desconexão com o reconhecimento do público que prestigia os chamados blockbusters aos quais ela, historicamente, não premia e nem parece valorizar real e, principalmente, a partir dos anos 2000. Com a categoria Terror/horror tem uma ruptura inexplicável e incompreensível. E ontem deu mais um grande sinal de como está atrasada e antiquada ao expor para o mundo que o etarismo é uma estratégia política de sua sobrevivência como indústria, em uma tentativa patética absolutamente desprezível de produzir ativos econômicos visando às produções futuras, à continuidade do mercado.
O QUE MANTÉM O MERCADO É O TALENTO. PONTO. Além disso, o sexismo Hollywoodiano - HOLLYWIDIOTA - é vergonhoso. E falta ainda mais ME TOO para evitar que certas figuras asquerosas continuem decidindo os caminhos da indústria e a premiação de ativos econômicos potenciais para os investidores e figurões dos estúdios, em detrimento de talentos reais e de suas atuações brilhantes a cada novo filme. A credibilidade da premiação e seu significado simbólico, historicamente construídos, ficam comprometidos. E um prêmio indevido injusto nessas condições é um ato preconceituoso e hostil. Artistas, profissionais da indústria e o grande público se sentem desvalorizados e manipulados quando isso ocorre. A isso somam-se a histórica xenofobia norte-americana, o fato de que há cupins gigantescos devorando as bases de sua democracia em pleno século XXI e a maneira cruel como o mercado audiovisual norte-americano tem se preparado para expropriar os artistas de seus talentos individuais, de sua voz e imagem intransferíveis e replicá-los à exaustão - às custas de contratos leoninos -, em obras pretensamente ficcionais e/ou de uso político, através de recursos de inteligência artificial.
Assim, entendo que Demi Moore e Fernanda Torres foram roubadas para que Madson gerasse expectativa na indústria pelos próximos 10 anos e filmes mega populares como Wicked (ou Barbie, em premiações anteriores) não têm reconhecimento da própria indústria à altura do trabalho que realizam em favor do mercado, da formação de público. Pior que tudo isso é ver que grandes filmes, grandes atuações, grandes artistas em todos os segmentos nunca vão alcançar a chancela do reconhecimento que merecem porque a academia de cinema norte-americana conta ainda com votantes sexistas, fetichistas, etaristas e gananciosos a serviço do lucro e de vinganças políticas e particulares.
Ou a indústria renova seus critérios, instaura um sistema permanente de compliance e reconhece como tem errado ao longo de sua história em muitas ocasiões ou continuaremos testemunhando injustiças, violências políticas indesculpáveis, preconceitos dos mais diversos e produções que misturam propaganda e memes inorgânicos.
domingo, 2 de março de 2025
Crônica: "Ainda Estou Aqui, Fernanda Torres e alguns Detalhes", de Erivelto Reis
Ainda Estou Aqui, Fernanda Torres e alguns Detalhes Erivelto Reis
Fernanda Torres fez um trabalho poucas vezes visto na história do cinema mundial. Um método de atuação pela contenção absoluta. Um trabalho próximo - e entendo, superior- ao de Jodie Foster em Nell ou Juliane Moore em Ensaio sobre a cegueira. Torcendo muito. Mas a história já está sendo feita.
Há outras muitas camadas de qualidade superior no filme Ainda Estou Aqui. A memória de Rubens Paiva, a luta de Eunice Paiva e seu legado pela democracia. A oportunidade de avisar claramente a todas as pessoas que os perversos detratores de nossa democracia mantêm uma sede de crueldade e de poder represada desde 1988. E muitos dos torturadores e seus hediondos admiradores ainda estão impunes e entre nós, seja pela herança do horror e da dor que nos impuseram, seja por seus asseclas, que tanto anseiam por emular aquele tempo de medo, supressão da arte, da liberdade, da democracia e dos direitos individuais e esperam promover a tortura e a ditadura em pleno século XXI em nosso país.Evidentemente, o texto potente de Marcelo Rubens Paiva, que transcende a questão das categorias de gênero, especialmente considerando-se autobiografia e autoficção é uma mola propulsora da narrativa.Destaco ainda o uso da trilha sonora como personagem - como bem percebeu minha querida amiga Simone Batista, a atuação de Selton Mello e o roteiro urdido como palimpsesto do texto do qual se origina e de nossa própria história. Fernanda Torres será para sempre a imagem de Eunice e desse cinema potente e vertiginoso produzido em nosso país. Um patrimônio de nossa arte, um exemplo das nossas maiores conquistas em todos os segmentos, um marco do talento de nossa gente.É preciso comentar que interpretação fantástica de Erasmo Carlos para uma composição com Roberto Carlos, lá dos idos dos anos 60/70 é uma chave poderosa de acesso à atmosfera daquela época. Erasmo Carlos é um dos nossos maiores compositores e É preciso ter cuidado,meu amigo dá prova disso mais uma vez. No entanto, o que sistematicamente se tem apagado desde o estouro da obra cinematográfica Ainda estou aqui é a possibilidade de se reler no acervo da dupla Roberto e Erasmo uma intencionalidade e ações artísticas e políticas de crítica e denúncia social, no âmbito da composição e da interpretação de Roberto Carlos, especialmente nos discos de 1969 e de 1971, mas não somente nesses discos.Não vou entrar no mérito aqui nesse espaço. Mas convido a quem me lê a ouvir os discos. No caso de Erasmo, o Tremendão, que sempre manteve a relação com o Rock e, consequentemente, com uma postura de contestação social. Essa rebeldia e esse posicionamento eram mais aparentes e visíveis. No entanto, seja pelo gênero romântico assumido por Roberto Carlos desde o álbum O inimitável de 1968, seja por leitura descontextualizada de uma foto com uma "condecoração" forçada - para uso e sequestro da imagem do artista pelo governo militar e pela existência de um memorando militar sobre autorização para um evento com uma menção particular ao gosto pelo artista, e mais nenhuma prova real, criou-se uma fantasiosa justificativa, (uma lenda urbana) para desdenhar, acusar e depreciar a obra de Roberto e se questionar, sem analisar ou conhecer a fundo o alcance de suas obras, o seu posicionamento ou a sua maneira de lutar contra aquele sistema. A isso juntemos alguns egos feridos pelas recusas do artista...Caetano, Chico, Gal, Nara, Elis, Tom Jobim, Gil e até mesmo Vandré reconheceram o trabalho, o "posicionamento" e a importância de Roberto. E a quantos e quantas ele ajudou em segredo durante aquele período terrível. Felizmente, sempre é tempo de rever posicionamentos e que bom que a arte nos ajuda, que Ainda estou aqui vem recolocar muitas coisas nas prateleiras certas. Ou pelo menos em prateleiras diferentes.O post é pra falar do filme, pra exaltar o cinema brasileiro, pra falar de nossa história e de nossa cultura, pra declarar minha admiração e gratidão pelo trabalho de Fernanda Torres, que independentemente do que venha a ocorrer no Oscar hoje já nos encheu de orgulho e esperança. Ainda estou aqui confirma que há muitos detalhes não tão pequenos que são coisas muito grandes pra esquecer.
Poema: "Qualquer Pessoa", de Erivelto Reis
Qualquer Pessoa
quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025
Poema: "Sulfite", de Erivelto Reis
Sulfite
Erivelto Reis
Uma educação
Para parecer Instagramável
Que não se mostre instável
Com resultados replicáveis
Em escala exponencial
Uma educação de elite só na tela
Cinematográfica
Que dê a impressão de que a dificuldade
Seja improvável
E de que seu fracasso seja só um caso isolado
Uma educação viral
Um produto sem contraindicação
Que custe bem caro
Mas que não demande investimento
No salário de quem faz o trabalho
E que fique bem na campanha
Da internet e da televisão
Que venda como água em um dia de verão
Uma educação que negue
Que a novidade só no papel existe
Uma educação que pareça ser de grife.
Que não cause melindre
Que saia no post, no tuíte e no jornal
Que negue ou que confirme
Conforme o print, sulfite
O quanto possa ser
Uma educação tiktoker,
Só de enfeite,
Super fake, superfície
Super prejudicial.