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Poeta - escritor - cronista - produtor cultural. Professor de Português e Literaturas. Especialista em Estudos Literários pela FEUC. Especialista em Literaturas Portuguesa e Africanas pela Faculdade de Letras da UFRJ. Mestre e Doutor em Literatura Portuguesa pela UFRJ. Nascido em Goiás, na cidade de Rio Verde. Casado. Pai de três filhos.

sexta-feira, 31 de dezembro de 2021

Poema: "Capim", de Erivelto Reis

 

Capim

Erivelto Reis

 

Quando encerrar-se

A minha existência terrena

Alguém terá que notar

Que eu estava numa arena

Lutando à beça

Alguém terá que reparar

Na dimensão aterradora

Das feras, dos monstros contra os quais lutei.

Não ponho reparo

Que chegue apenas tarde

Essa percepção

Mas me magoa se ela não chegar...

Isso posto,

Nada importará.

Dão-te alguma chama,

Um pouco de conhecimento,

Centenas de idiossincrasias

E a isto chamam alma

E do que dela vaze e te defina,

Ainda que parcialmente,

Chamam de talento, id, ego,

Personalidade,

Temperamento...

Quando eu me for

Fui porque fui

E não há volta

Nem memória em papel carbono

Há apenas esquecimento, abandono, ano após ano...

Apesar de qualquer escritura

A vida rememorada

É ficção pura

Literatura e lápide e fim

Num crematório, a sete palmos,

Ou no infinito ermo de uma biblioteca

(Teia de aranha, mofo, poeira)

Crescendo saudade e remorso

Como arbusto, matagal e capim.

sábado, 18 de dezembro de 2021

Crônica: "PASSOU PASSOU, PASSOU PASSANDO OU PASSOU PASSADO?", de Erivelto Reis

 

PASSOU PASSOU, PASSOU PASSANDO OU PASSOU PASSADO?

Erivelto Reis

                                                                                                      

Para a Flávia Valim e para o Cícero César,

com os quais sempre converso a respeito.

 

               Na feira... no mercado... no ponto do ônibus... pelo zap...

               – E teu filho?

               – Que é que tem ele?

               – Passou passou, passou passando ou passou passado?

               – E qual é a diferença? Ele passou!

– Aí é que você se engana. Há muita diferença.

– Se ele passou passou nós temos que saber, por exemplo, se ele teve todas as aulas, de todos os professores, em que condições a escola lidou com os professores, se eles recebiam seus salários de forma justa, se a escola forneceu equipamentos, cursos de capacitação, incentivos para se adaptar ao modelo remoto/híbrido durante esses quase dois anos de pandemia...

– Você sabe que a escola do meu filho é particular. Dessas que fazem anúncios no horário nobre. Tem filho de artista e tudo estudando lá. É num bairro legal. Tem funcionário de apoio pra ajudar a gente a parar em fila dupla no trânsito na hora da entrada e da saída... Lá a coisa é chique. Mas você sabe, é particular. É uma empresa. Quem não tiver satisfeito com o salário que peça as contas... E além do mais, a escola paga o piso do magistério. Não tá bom?

– Então teu filho passou passando.

– Como assim?!

– Quando não há valorização do magistério, de todo o corpo de funcionários de apoio, administrativo, seja na rede pública ou particular, nossos filhos, ainda que em condições de frequência e aprendizado, estão apenas passando. Porque a sociedade está atrasado, porque o sistema que deveria valorizar a educação está sobre ela explorando a força e a capacidade intelectual dos professores e funcionários. Assim, mesmo que seu filho tenha um ótimo aproveitamento, o cenário de relações interpessoais, as relações em sociedade não se modificam, porque ele fica isolado nessa “ilha”. Ou seja, por mais preparado que esteja, apesar da exploração da força de trabalho e da desvalorização dos professores, a sociedade não estará num ponto de evolução para uma troca. Logo os embates, o desemprego, as oportunidades, a insegurança da sociedade... estarão ainda na pauta e na vida do seu filho. Logo, ele passou passando. Significa que a escola particular usou seu investimento para a educação de seu filho para gerar lucro, para gerir com o menor recurso possível a folha de pagamento de professores e funcionários e não para transformar a sociedade da qual seu filho faz parte como aluno e de que fará parte enquanto cidadão educado e formado.

O mesmo raciocínio se aplica ao governo pela mesma prática. Com o agravante de que nesse caso, a corrupção, os desvios de verbas, a falta de respeito às leis, o assédio moral ao funcionalismo, a privatização de setores ligados à educação, a interferência política, via coordenadorias e secretarias, a perseguição a funcionários e profissionais atuantes sindicalmente, tudo isso faz com que o quadro social vá se deteriorando entre uma geração e a outra. Ou seja, seu filho enfrentará, com menos recursos um mundo ainda com mais conflitos e crises do que aquele que você enfrentou.

Sem falar na redução da oferta de trabalho, do achatamento salarial em todas as categorias, das perdas de direitos, da manipulação de setores organizados da sociedade contra os próprio povo, da perda de direitos, liberdades e garantias constitucionais...

– Então, quer dizer que mesmo na escola particular carérrima, meu filho passou passando e que as oportunidades para ele são menores?

­– Não é que sejam exatamente menores. Pode ser que ele tenha uma grande formação e tenha todo êxito naquilo que escolher fazer. O problema é que nesse sistema, baseado no modelo econômico da exploração da força de trabalho, o abismo social, a desigualdade, as injustiças sociais se perpetuam e se expandem.

– Mas na reunião de pais, eles disseram que o reajuste das mensalidades era justamente em decorrência do aumento do salário dos professores...

– E você acreditou? Vamos lá, trezentos reais de aumento, vezes 1000 alunos divididos por X professores e funcionários... Você acha que essas pessoas receberão esse aumento nessa proporção?

– Agora fiquei curioso. E o “passou passou”?

– O passou passou é uma utopia. É quando as condições sociais, emocionais, afetivas, psicológicas, econômicas da vida do estudante, o espaço escolar, as relações familiares, o quadro social estão em harmonia positiva para que ele possa sentir segurança e perceber que há perspectiva de ingresso no mercado de trabalho, de desenvolvimento de suas potencialidades, segurança para a prática de atividades esportivas, culturais, para formação continuada, valorização de sua formação... A escola não é um organismo isolado do mundo. Não é um depósito de gente. E não tem condições de resolver todas as questões inerentes da formação de um indivíduo. Mas é na escola – principalmente na escola pública – que as pessoas – especialmente a grande maioria da população –, tendem a solicitar ajuda para amenizar ou tentar solucionar esses problemas. Na escola não temos médicos, nem psicólogos, nem assistentes sociais, nem quaisquer profissionais além daqueles entendidos pelos governos como estritamente necessários para chamar um espaço de escola.  Não há investimento em tecnologia, acessibilidade, modernização dos recursos. Apenas propagandas e jogos de palavras para esconder a incompetência e o desinteresse pela formação da população.

– Quer dizer que a escola particular, mesmo as boas e caras, não têm como mudar o entorno social e ainda exploram a força de trabalho de seus funcionários e professores e que a escola pública é gerida por incompetentes e por interesses econômicos e políticos?

– A escola pública tem grandes e muito bons profissionais entre seus quadros. A questão é que a iniciativa privada está cada vez mais ávida por essa fatia do que o governo deve por lei investir em educação e quer fazer com que esse dinheiro troque de mãos. Ou seja, deixe de ser administrado pelo governo e que possa custear a educação pública e passe para as mãos de grandes conglomerados financeiros e educacionais que prometem melhorar a qualidade do ensino público, desde que essas empresas sejam contratadas pelo governo.

– Não entendo. Se o governo tem profissionais de excelência na educação e se alega ser capaz de fiscalizar um serviço quando esse é privatizado, por que não dá condições a esses profissionais e investe o dinheiro que é de todos e é garantido por lei na melhoria da formação de seus alunos, de seu povo.

– Porque não se trata de educar o povo, mas de fazer o dinheiro público mudar de mãos. Assim empresários financiam suas campanhas; assim percentuais de contratos bilionários são pagos – sob inúmeros disfarces – como propina; assim se negociam cargos políticos com salários exorbitantes nos mais variados escalões da administração pública.

­– Mas se as empresas têm competência e querem administrar a escola pública, por que não permitir?

– Por razões bem simples: 1) educação pública é soberania nacional; 2) educação pública é direito da população e dever do estado e 3) você já viu empresa particular melhorar efetivamente o serviço que presta à população? Eles mentem, enganam... Investem milhões e milhões em propaganda, falsificam números, estatísticas... fazem um modelo como padrão de alguma coisa ou serviço, filmam, fotografam, colocam pra funcionar por um tempo e em algum lugar e alegam que aquele é o padrão pra todo o serviço que oferecem. Quando sabemos que estão apenas interessados no lucro. Da telefonia à saúde passando pelo transporte público, obras, construções... você entende agora?

– Nisso você tem razão. Então quer dizer que eles ficam com todo o dinheiro da educação colocam uma ou duas escolas modelo em cada estado e depois a população e os profissionais de educação que lutem...

– Pera lá... Que “profissionais da educação”? ... A iniciativa privada contrata quem ela quer. No serviço públicos estão profissionais concursados, com carreira e formação profissional comprovada, continuada, com experiência e em constante aperfeiçoamento. Passam no mínimo por três bancas até serem aprovados e por pelo menos três anos de estágio probatório depois de assumirem seus postos. Mas as pessoas não sabem dessas informações. Os profissionais têm diretores, coordenadores gerais, coordenadores por área, reuniões de desenvolvimento por área, reuniões bimestrais, reuniões semestrais, reuniões anuais de planejamento, avaliação, autoavaliação. Têm fichas, diários, planilhas, documentos, provas, trabalhos, projetos que dependem de, no mínimo três verificações, três assinaturas – além de fiscalização externa de coordenadorias específicas – a cada um desses documentos. Você acha mesmo que se a iniciativa priva cometer um erro que a faça perder um contrato de bilhões, ela vai assumir o erro, indenizar as pessoas e sair do mercado para que outra “empresa idônea” assumir? Não. Ela vai manipular números, dados, demitir pessoas, mudar de nome, de marca, fazer propaganda pra distorcer as informações... Estão aí os crimes em Mariana e Brumadinho que comprovam essa tese.

­– Mas eu li que durante a pandemia o governo colocou muitos recursos à disposição.

– O governo colocou muitos recursos à disposição das grandes empresas. Como o Google, por exemplo. Como a rede de TV Bandeirantes.

– Mas não dava pro governo mandar um computador e internet pra cada aluno...

– Mas também não mandou um livro, não mandou material, alimentação... Não cuidou das pessoas. Não cuidou dos profissionais. Mas disponibilizou telefones para que profissionais de educação fossem denunciados. O governo simplesmente deixou o tempo passar, colocou uma plataforma digital – pra ser acessada por quem muitas vezes não tem sequer arroz e feijão em casa pra comer – colocou “aulotas” – aulas produzidas gratuitamente por professores públicos para passar de manhãnzinha na TV aberta que recebeu milhões por uma hora por dia na sua programação.

– Ah... entendi. Então, por isso, houve agora essa aprovação em massa por decreto. Porque o governo sabe que não foi capaz de gerenciar a educação em quase dois anos de pandemia. Por isso o a expressão “passou passado”. Porque o governo passou por decreto alunos e alunas que não tiveram a oportunidade real de aprendizado, já que o governo não criou meios reais para que ela ocorresse. Isso é gravíssimo. Se os alunos não aprenderam, mas foram promovidos, então todo o esforço dos profissionais da educação, a pedagogia, as didáticas, as metodologias que aplicaram para tentar ajudar os alunos e mesmo o fato de que já no final do ano foram obrigados a retornar ao ensino presencial ainda durante a pandemia... foi um risco desnecessário, porque os professores, os alunos e as suas famílias foram desrespeitados. Aprovar todo mundo é uma forma do governo lavar as mãos. Dar um “cala boca” na população. Evita que as pessoas cobrem o governo. Disfarça. É um engodo contra os mais pobres. Na prática, se considerarmos um aluno que foi promovido, por exemplo, para o terceiro ano do Ensino Médio, vamos perceber que desde que entrou no estado em 2020, no primeiro ano e em 2021, no segundo ano, esse aluno teve, se tanto, setenta, oitenta dias de aula presencial. E mais nada. Não pode contar com nenhum recurso real por parte do governo e agora está indo pro terceiro ano. Ou seja: foi dormir no nono ano do fundamental e acordou no terceiro ano do Ensino Médio, sem ter tido a oportunidade de aprender um milhão de coisas fundamentais pra sua formação, sem praticar a leitura e a escrita, sem amadurecer sua reflexão crítica, sem desenvolver suas habilidades sociais, cognitivas, emocionais e afetivas.

– E ainda há uma agravante!

– E tem coisa mais grave do que isso ainda?!

– Infelizmente, sim.

– O quê?

– Os milhares de alunos e alunas que abandonaram a escola. Perderam o fim de sua infância e o início da adolescência por conta de que a escola deixou de estar presente em sua vida real. Porque não tinham recursos de tecnologia e acessibilidade pra manterem-se em interação com a escola. Cada aluno e aluna que abandonou é uma vítima da péssima gestão do governo do estado durante a pandemia. Cada aluno e cada aluna que ficou ainda mais exposto à violência, à fome, à exploração, ao desalento, à falta de perspectiva de futuro durante e a partir do período de pandemia, é responsabilidade do governo.

– Então o governo deveria ter investido, criado programas de recuperação escolar, aulas integrais ou no contraturno, contratado profissionais – inclusive psicólogos e assistentes sociais –, para garantir o mínimo de segurança alimentar para os alunos e alunas e suas famílias...

– Sim, deveria. Mas fez uma jogada. Aprovou todo mundo por decreto na busca por se isentar da culpa por sua irresponsabilidade e assim ainda desmoraliza a educação pública e transfere a responsabilidade pela má formação escolar, pela exploração da força de trabalho, pela subalternização, pelo desemprego, pelo fracasso pessoal e profissional das pessoas mais pobres para elas mesmas, pois o governo chegou até mesmo a aprovar por decreto.

– Isso é cruel. Porque na hora as pessoas não vão entender o quanto estão em desvantagem na sua vida em relação a outros alunos e alunas de escolas de granfinos – mesmo que sejam escolas que exploram os seus trabalhadores como já sabemos – mas o fato é que desde o início do pandemia os filhos dos mais ricos continuam aprendendo, tendo contato com a escola, com a literatura, com a educação, com as matérias de exatas, com as matérias de ciências, as biológicas, as relacionadas à tecnologia... ou seja, continuaram aprendendo coisas importantes e fundamentais para sua formação pessoal, intelectual que vão ser extremamente necessárias quando chegar a hora de prestar o ENEM, de escolher uma faculdade, uma carreira. Enquanto os jovens mais pobres da população...

– Não tiveram nenhuma oportunidade real de acesso (ainda viram o governo federal aumentar o valor da taxa de inscrição pro ENEM, entre outras maldades contra os mais pobres), passaram dificuldades inimagináveis. E agora, promovidos por decreto, estão certificados por um governo incompetente e hipócrita.

– Isso é muito triste. É o futuro desses meninos e meninas que está em jogo. E o que o governo e seus secretários e assessores fizeram é um crime contra a escola pública e o contra o futuro do país.

– Sim. É.

– E não vão ser punidos?

– A menos que a população se levante exigindo condições de aprendizado reais e valorizando o trabalho dos profissionais da educação, cobrando o empenho, um bom comportamento, com civilidade, ética e respeito às pessoas por parte de seus filhos e filhas, nada acontecerá. Ou pior: o pior acontecerá.

– Mas se um time que nem jogou o campeonato fosse declarado campeão, todo mundo ia reclamar. Inclusive o próprio time. Você não acha?

– Boa pergunta...

– Pelo menos agora, não tem mais como piorar, né?! Assim que passar a pandemia, é conscientizar os meninos e meninas, conversar com suas famílias... Caprichar nas aulas de Língua portuguesa, Sociologia, Biologia, História, Geografia, Filosofia...

– Acho que não será possível...

– Como assim?! Não brinca com essas coisas! ...

– Você já ouviu falar no “Novo Ensino Médio”?

– Não. Mas se é “novo” deve ser bom...

– Aí é que você se engana. O Novo Ensino Médio retira da grade dos alunos a obrigatoriedade de se aprender boa parte dessas matérias, coloca-as como optativas e ainda reduz o tempo das disciplinas que permaneceram na grade como Língua Portuguesa e Matemática, por exemplo. Cria uma ampliação apenas virtual do número de horas do ensino médio.

– Como assim? Se tira uma disciplina, significa que o aluno vai passar mais tempo aprendendo outra coisa, não é?

– Nada disso. Elimina ou coloca como optativas várias disciplinas fundamentais e passa a contar o tempo do aluno em idade escolar para o ensino médio, mas não a carga horária cursada. Na prática, desde a matrícula no Ensino Médio, até a conclusão o aluno terá horas contabilizadas em sua grade, mas não estudará efetivamente esse mesmo número de horas nem nas disciplinas obrigatórias, nem nas disciplinas optativas. É o registro do vínculo que faz com que haja a impressão de ampliação de carga horária.

– Isso é como o taxímetro rodando com o táxi parado sem sair do lugar. No final não se chega a lugar nenhum e a conta da corrida será caríssima.

– É exatamente isso.

– Agora estou entendendo tudo.

– Mas pelo menos os alunos ainda poderão ir à escola pra merendar...

– Nem isso. Com a diminuição do vínculo de horas de disciplinas cursadas, no terceiro ano, o aluno quase não precisará estar na escola. Segundo o texto, estará empreendendo, a um passo de conseguir o seu novo emprego. Logo, proporcionalmente, as verbas pra merenda escola atenderão á demanda formal da carga horária.

– Que covardia! Sem aula e sem comida! Com menor tempo de preparação e leitura pra enfrentar a prova do ENEM...

– Isso mesmo...

– Por isso você me provocou com a expressão “passou passou, passou passando, passou passado” ?! Agora tudo faz sentido. E os professores e os sindicatos não reagem?

– Alguns, sim. Mas pra muita gente, o discurso do opressor, mais o salário na conta – mesmo que pouco – já é uma forma de desmobilizar. Não é que concordem. É que entenderam que o sistema não vai mudar

– Mas mesmo assim, cumprem essas ordens muito contrariados, não é?

– Infelizmente, não. Há até os que gostam e emulam os discursos do opressor que responsabiliza as vítimas.

– Mas tem alunos que só pela misericórdia, não é?

– O sistema opera contra eles. Eles reproduzem com o desinteresse que demonstram pela escola o que recebem como informação e prática do senso comum. Além de perceber que a profissão do professor está a cada dia mais desvalorizada.

­– Não sei... tem uns alunos...

– Tem gente de todo tipo em todo o lugar. Mas se houvesse uma política de educação e valorização dos profissionais de educação, esses casos seriam uma gota no oceano e seriam de condução e resolução muito menos conflituosa.

– A escola é o espelho da sociedade, é isso?

– Essa é uma leitura. Não dá pra ter uma cidade, um estado ou um país dominados pela violência, pelo desemprego, pelo caos urbano, pela corrupção de seus governantes, pelo desprezo de sua elite aos mais pobres e por qualquer política de atenuação do abismo social e imaginar que esses conflitos não vão aparecer na escola. Claro que vão. Em algum momento... Mas ainda assim, apesar de toda a desvalorização, da falta de recursos, de investimentos, a escola ainda é um oásis na sociedade. E é obrigação de estado, garantida pela constituição mantê-la democrática, gratuita, equânime, socialmente referendada, com qualidade, laica e acessível a todos e todas.

– Falou bonito. Se fosse um político tinha o meu voto. Mas também os políticos prometem, prometem e depois de eleitos não cumprem o que prometeram nem a sua obrigação. Não tem jeito. Não tem saída.

– Respeitar e valorizar os profissionais da educação, conscientizar os filhos ou os menores sob sua responsabilidade, educá-los para a compreensão do que significa estar na escola, lidar com as pessoas, valorizar o momento de aprendizagem é fundamental. Acompanhar bem de perto o dia a dia na escola, dialogar com eles sobre o que aprenderam, mostrar-se presente no processo de seus filhos já será de grande ajuda.

– E cobrar dos políticos que respeitem as leis e a escola pública. Que invistam, que paguem melhores salários, que deem melhores condições e mais recursos para a escola. E pensar que nossa conversa de hoje começou assim: “passou passou, passou passando, passou passado”...

 

sábado, 30 de outubro de 2021

Crônica: "Assédio Moral, mas com Ternura e (Re)Conhecimento", de Erivelto Reis

 

ASSÉDIO MORAL, MAS COM TERNURA E (RE)CONHECIMENTO

Erivelto Reis

 

          Era uma vez um assédio moral... Eu queria começar assim. Mas esse não é um conto de fadas. (Leia com acento irônico, tá?!).

A gente sente que está trabalhando no lugar certo quando se depara com um nível socioeconômico, cultural, estético, artesanal de assédio moral praticado com classe, com refinamento, com entrelinha, com suporte e contexto. Um assédio moral amplo o suficiente para intimidar a todos e todas, mas sutil a ponto de levar o assediado ou assediada da vez a pensar, envergonhadíssimo/a: “hum, tô achando que isso é comigo”.

Ser moralmente assediado é um indício inequívoco de que você soube realmente escolher a sua profissão. Já pensou que infelicidade sofrer assédio moral numa profissão de que você nem gosta?

          O assédio moral é um extra, é um “a mais”, é um plus, é um “certificado de qualidade” nos descalabros que alguém possa experimentar em sua trajetória profissional.

 Não basta apenas te subvalorizarem ou desvalorizarem como política de governo ou política empresarial.

Não basta apenas pagarem mal ou reduzirem as suas condições de trabalho ao mínimo para a realização de sua tarefa (como se te deixassem num mundo sem nada, sem eira nem beira, e dissessem: “agradeça porque você ainda tem oxigênio para respirar. Tá reclamando do quê?”) ... É preciso assediar como quem empreende.

Não basta apenas ignorar a sua formação continuada, sua titulação, sua trajetória dentro da área na qual você atua – um cargo que dê a outrem o poder de te assediar parece ser o antídoto pra qualquer qualificação.

O ideal para o assediador ou para os chefes dos assediadores parece ser a prática de nivelar por baixo as interações, no que concerne a respeitar a carreira, valorizar e dar condições de trabalho. Os gestores parecem ter feeling para escolher quem possa e queira e saiba assediar indistintamente, mediante a repetida justificativa, quase um mantra, um salvo conduto, de afirmar que “a chefia está cobrando”.  

O assediador é teu amigão, convenhamos. Vai te ferrar por uma coisa que não é sua responsabilidade, mas te avisa antes. Fala sério.

Nesse caso, a premissa é ter alguém disposto a fazer o serviço do dia a dia do assédio moral para livrar a cara da secretaria, da gerência, do governo, do dono da empresa, da corporação, da repartição, do responsável pelo espaço, qualquer que seja ele, onde o assédio ocorra, se alguma coisa der errada. As poucas leis que nos restam atrapalham a jornada, a escalada de assédio dessa gente iluminada.

Já não se faz mais aquele assédio moleque de antigamente. Assédio arte, maroto, criativo, perspicaz. Aquele assédio moral da piadinha ou da indireta, meio que escapando sem querer, na roda dos escolhidos contra o incauto ou incauta que nem sabe que a sua batata está sendo assada.

Aquele assédio existencial de repetir, normalmente depois de um toque, que ninguém é insubstituível, e que o assediador não quer de jeito nenhum que o caso vá parar na “chefia” – ou no nome do setor que seja equivalente ao departamento que deveria planejar e zelar para que as situações de assédio não ocorressem, mas que acaba é legitimando pequenos e grandes assédios morais capazes de destruir carreiras.

Esse tipo de frase dita em tom de conselho quando você está sendo descascado ao vivo e a cores, on line, por e-mail, torpedo, por áudio, vídeochamada etc., por algo que nem é sua responsabilidade e que destaca amistosamente que é fundamental que você reveja sua postura porque sua personalidade te atrapalha e você nem é tudo isso que você pensa.

Tampouco vemos o tempo todo aquele refinamento do assédio travestido de memorando, de resolução, de e-mail oficial... isso eram outros tempos. Um assédio clássico. Daqueles que deixam provas institucionais. É um tipo de assédio moral como os de antigamente, que ensinou os assediadores e assediadoras não a pararem de assediar, mas a travestir o assédio sob a forma de “pontos de vista conflitantes”, “problemas interpessoais”, “novas diretrizes”, “projetos reestruturastes”, “recuperação de perdas”, “pequenos toques”, “não é culpa de ninguém, mas você tem de resolver”.

Imaginem: o assediador é um ser de luz que não tem problema com ninguém a quem não esteja assediando – só com você, que por uma infeliz situação de alinhamento do mapa astral, é um assediado/a incompetente e relapso/a. O mundo corporativo, educacional, empresarial é do tamanho de uma noz. E coincidências acontecem.

Podem me chamar de saudosista: mas já foi o tempo em que você precisava pelo menos estar no espaço físico da empresa, da indústria, da repartição, do escritório, da escola para ser assediado. O mundo está conectado: e o assédio hoje é delivery, mesmo que você não peça (olha o assediador: “fulano/a parece que gosta de passar vergonha. De ser chamado/a a atenção”). Você pode até tirar licença ou férias da empresa, mas não tira férias do assédio. Ele aparece. Ele brota. Ele vai até você onde quer que você esteja: na sua casa, na praia, no campo, no posto de vacinação, no supermercado...

Talvez já tenha acontecido: você está no recanto da sua intimidade, dando aquela namoradinha gostosa, e, de repente, lá está a mensagem do assediador, nas ondas do teu wifi, na tela do teu celular, que vibra broxante e inconveniente, e te rouba, no teu horário de folga, o direito de não continuar a ser assediado.

Ou então: naquele momento em que você, antes de entrar na missa, no culto, na sessão centro espírita ou no terreiro ao dar uma última olhada e desligar o aparelho celular, antes de voltar o pensamento para entidade superior, e lá está a mensagem de assédio: disfarçada sob o manto da proatividade, de planejamento, de aviso, de lembrete. Na maioria das vezes informando pra geral (dizem: “socializando o problema, o fato”) algo que deveria ser conversado em particular com o devido destinatário da mensagem no local de trabalho em seu dia e em seu turno, se e quando, além do cargo, o remetente da mensagem tivera alguma base legal para a reclamação, o informe, o assédio.

É como se o cartão de crédito enviasse um comunicado com um extrato a todos os clientes por causa de apenas um devedor. E nós sabemos como as empresas de cartão de crédito têm expertise em transformar pagadores corretos em devedores deprimidos e contumazes. O assédio moral são os juros abusivos que o teu patrão cobra de você por algo que ele não te deu e que você já pagou faz tempo.

Felizmente, está surgindo uma nova geração de assediadores e assediadoras. Mais conscientes, mais ciosos do aperfeiçoamento e da naturalização do assédio como índice permanente de geração e aferição de qualidade. Muitos e muitas dessa nova geração oriundas das mesmas dificuldades e desafios que ora afligem e impedem seus pares de mostrarem toda a subserviência que seus patrões, secretários de educação, chefes de setor, e quetais esperam que eles e elas tenham. Parece que anos de assédio moral não foram suficientes para quebrar a resistência dessa gente indolente e atrevida que não se dobra e reage aos/às assediadores/as.

É muito importante, no atual cenário mundial, que haja assediadores com consciência de classe, que se identifiquem com os profissionais que estão assediando, a ponto de reconhecer que nada que digam em defesa de si mesmos/as, ao serem assediados/as, justifica a incompetência que lhes seja atribuída.

Nota-se que os assediadores tentam minar a resistência dos assediados em abandonar posturas éticas e profissionais inegociáveis. E que o assédio visa camuflar a incompetência dos gestores públicos.

Não é assediar que irrita o assediador. Disse ele até gosta. Mas o fato de que o assédio – única coisa real que ele produz no espaço onde trabalha é realizado dentro e fora do horário comercial. Além disso, o assediar, têm a dupla função de realizar o trabalho de intimidar aos demais membros da equipe, do grupo de whatsapp, do setor, que são obrigados a tomar conhecimento daquele assédiozinho quase carinhoso de botar o funcionário ou funcionária, alvo do assédio, no seu devido lugar. Que, todos sabemos, é um lugar de medo, insegurança, opressão, incerteza e baixíssima autoestima.

Produzir em equipe é isso. Assediar como princípio de gestão e controle. E não será alguém que não aceita ser assediado/a que vai quebrar o padrão da empresa, escola, indústria, comércio ou repartição. Afinal, é assediando que se progride.

Ninguém sabe como é difícil para assediador se especializar na burocracia e na linguagem que o caracteriza. Cobrar a produção, o comportamento, a técnica, a habilidade para algo que, na maioria das vezes, ele não entende ou seria capaz de executar se estivesse na pele do assediado exige muito desprendimento, muita doação. Afinal, não se pode deixar para amanhã o assédio que se pode produzir hoje.

Por que deixar para conversar pessoalmente no dia seguinte, a respeito de algo que só poderá ser resolvido presencialmente, quando se pode mandar um áudio para tirar do equilíbrio emocional, da harmonia familiar um/a profissional que sempre agiu corretamente. Por que não assediar on-line para com que o assediado ou assediada perca o sono hoje, por conta de algo que se poderia resolver em horário comercial? É até uma questão de solidariedade do assediado para com o assediador. Assédio moral, sim, mas sem perder a ternura.

Outro dado importante é que sindicatos, tratados e convenções profissionais, insisto: a formação e o histórico do assediado, pouco ou nada valem diante da urgência da mensagem de assédio. Elas – as mensagens de assédio – de tão comuns já deveriam constar dos planejamentos, fazer parte da rotina das grandes empresas, do dia a dia do servidor, do checklist de atividades. Que “sextou” que nada! “Happy hour” pra quê? Quando se pode sair do trabalho com o peso do assédio moral nas costas, com um mundo de tarefas pra fazer em casa sem a devida remuneração?

Só os ingênuos não perceberam que o assédio moral parece ser a única forma de confraternização possível.

A autoestima de um indivíduo pode ser reduzida a uma massa mole, um slime emocional de inseguranças, um poço sem fundo de revoltas contra as sistemáticas injustiças, perseguição pessoal e profissional e exploração laboral, a desigualdade salarial, as afinidades eletivas que desaguam em injustificáveis protecionismos... mas a empresa, a repartição, os chefes, as secretarias devem estar satisfeitas. As metas devem ser batidas. O Assédio como missão. Mas não coloca isso no cartão da empresa.

A paz e a qualidade têm de estar documentadas, mesmo que sejam uma ficção barata de quinta categoria e sem qualquer base legal de sustentação. E ai daquele que se rebele, questione e retruque. É a desgraça sem fim. É a dor de cabeça. É o climão ad eternum ou enquanto o assediador não te jogar pra fora do carro de seu próprio local de trabalho em alta velocidade como num filme de James Bond ou como no multiverso de Os Vingadores. O assédio moral é o cupim da estabilidade, caso você seja um funcionário público. É uma ferrugem, uma corrosão permanente.

O assédio moral pretende garantir, na iniciativa privada e no serviço público, a servidão do/a profissional capacitado/a e qualificado/a aos interesses de chefes comprometidos com valores outros que não os inerentes ao serviço e às boas práticas profissionais.

Pensem: um funcionário que produz bem com péssimas condições de trabalho, deixa claro que mesmo que o assédio torne ainda piores essas condições, ainda continuará produzindo. É uma lógica irrefutável.

Admirável, ainda, é como os assediadores não se atrapalham nem se assediam entre si. E olha que nem usam crachá. Parece que se reconhecem. Haveria uma confraria de assediadores? É como se tivessem como princípio: “Deus me livre de assediar um colega assediador no exato momento em que ele está assediando alguém que não cumpriu o que a chefia só decidiu executar/implementar há meia hora”. O Brasil é o paraíso do assédio moral institucionalizado. Aliás, uma instituição que nunca parou de funcionar.

Ouvi dizer que existem, conheço e até trabalho com alguns chefes, diretores, coordenadores, que não assediam colegas e seus comandados nem sob pressão de superiores, mesmo que percam o cargo, mesmo sabendo que depois deles possa vir um outro assediador.

Pelo andar da carruagem, no entanto, essas pessoas serão chamadas em breve para um curso de reciclagem. 

sábado, 23 de outubro de 2021

Poema: "40", de Erivelto Reis

 

40

Erivelto Reis

 

Passou dos 40 evite

O que pinga

O que queima

O que espeta

O que salga

O que adoça

O que não deixa dormir

O que não deixa acordar

O que embriaga

O que não te agrada,

O que te maltrata e o que te multa.

O muito amargo

O muito azedo

O destilado

O do outro

Passou dos 40

Você é bibelô

Produto de camelô

Evite

Viver no limiar, no limite

Excesso de amor

Falta de amor

Ciúme, mau hálito, hábito, humor

Muito ou pouco perfume

Exercício demais

Exercício de menos

Gordura trans

Torresmo

Passou dos 40

É plástico bolha

Cuidar da sua vida

Melhorar as escolhas

Evitar tombo

Abandono

Emocional, inclusive.

Passou dos 40

É preciso buscar qualidade,

Equilíbrio, aprendizado

Passou dos 40

É preciso carinho

É preciso cuidado

Passou dos 40

É preciso um mapa

Uma bússola

Uma garrafa d’água

Vergonha na cara

E humildade pra pedir desculpa

Procurar definitivamente a sua felicidade

Não esperar que ela bata à sua porta

Passou dos 40, é tempo de viver

O aqui e agora

É tempo de recordar,

E de construir o futuro

Passou dos 40

Já passou da hora.

quarta-feira, 20 de outubro de 2021

Poema: "Pet", de Erivelto Reis

 

Pet

Erivelto Reis

 

Não deixe o amor preso, dormente,

Debaixo de um sol escaldante

Na gaiola ou na corrente.

Eu só tenho essa certeza:

Amor preso, desprezado,

Igual bichinho assustado,

Canta, mas é de saudade,

Late, mas é de tristeza.

 

Se for embora, deixe livre o seu amor

Pra que ele ao menos corra,

Pra que ele ao menos voe,

Aguardando nova casa.

Se não souber dizer pra onde vai,

Não vá confinar o amor...

Que ele morre, ele se acaba.

 

Eu só tenho essa certeza:

Amor preso, desprezado,

Igual bichinho assustado,

Canta, mas é de saudade,

Late, mas é de tristeza.

Poema: "O Rapa", de Erivelto Reis

O RAPA

Erivelto Reis

 

Assim que eu vi a carreta dobrar a esquina

E os mano desfilando de fuzil, pistola e carabina

Eu pensei agora é que não vamo ter sossego

Mas era o bonde pra buscar o arrego

Mas era o bonde pra mirar nos preto,

E nos moleque, nos barraco, nos cachorro,

Nos tiozinho com as carteira de trabalho,

E nos crente com a bíblia sob o braço...

Eram os home pra pegar o bonde

Era o bonde esperando os home

E o céu coalhado de helicóptero e drone

E as família tudo no sanhaço...


Tavam matando todo dia o mesmo

Tavam matando todo dia um novo

Tavam batendo nos do próprio povo

Tavam batendo em todo mundo a esmo

 

Assim que eu vi a carreta virar na esquina,

Vi meu barraco passar na TV

Vi minha rua passar na TV

Eu tive medo de outra chacina

Na minha rua só de lama e lixo

A minha rua só de medo e risco

A minha rua que não tem escola

Só uma igreja e uma mercearia

Só um terreiro e uma padaria

E perguntavam pelo movimento

Àquela hora ninguém nem respirava

Àquela hora ninguém se mexia...

 

Tavam matando todo dia o mesmo

Tavam matando todo dia um novo

Tavam batendo nos do próprio povo

Tavam batendo em todo mundo a esmo

 

Assim que eu vi a carreta virar na esquina

A mesma cena sempre repetida,

A mesma história que eu já conhecia:

O filho morto, a filha órfã, a mãe viúva,

O pai sumido e uma pá de corpo numa vala

E cala boca, não perguntei nada

E vai dizendo onde é que fica a boca

E os bagulho, e as peça e as parada?!


Assim que eu vi a carreta virar na esquina... 

terça-feira, 12 de outubro de 2021

Texto: "O novo ensino médio e o dia das crianças", de Erivelto Reis

 

O NOVO ENSINO MÉDIO E O DIA DAS CRIANÇAS

 (12-10-2021)

Erivelto Reis

 

O novo Ensino médio coloca na linha imediata da insegurança social e alimentar, da subalternização e da precarização do acesso a bens elementares imateriais de leitura, arte e cultura milhares de adolescentes dos 15 aos 18 anos, todos e todas oriundos/as das camadas mais pobres da população.

Amplia e aprofunda o abismo social, reduz ao nível formativo inferior ao mínimo necessário em diversas áreas do saber e torna ainda menores as possibilidades de ingresso no Ensino Superior, levando-se em conta, por exemplo, a produção de redação - é a já famosa nota mil - ou a interpretação dos enunciados, linhas de comando e dos distratores das alternativas em questões de múltipla escolha para atingir uma nota de corte mínima para o ingresso em cursos mais ligados às humanidades e tornando ainda mais intransponível alcançar patamares para a escolha e ingresso em áreas como medicina, biotecnologia, direito, engenharia, entre outras inúmeras áreas .

Além disso, praticamente decreta a extinção de cursos ligados às disciplinas arbitrariamente relacionadas como optativas, e coloca em compasso de extinção disciplinas L2 (espanhol e inglês) e educação física.

Cumpre ainda a tarefa sórdida de fragilizar ainda mais e desestimular a escolha pelo magistério como profissão, promove uma reforma arbitrária e uma subalternização da ordem de um assédio moral gigantesco e sem precedentes contra os profissionais da educação, diretamente sobre os professores e professoras, por intermédio das medidas de reorganização administrativa e gerencial que certamente o Novo Ensino Médio trará e que desprezará em seu cerne editais, investiduras, formação continuada, qualificação profissional etc... para permanência, determinação de origem, organização de quadro de horários e elevará, consideravelmente, o volume de trabalho dos que permanecerem alocados. Sem falar na fragilização das relações interpessoais e profissionais entre os gestores, colegas, polos administrativos e entre docentes e discentes.

O Novo Ensino Médio isenta a obrigatoriedade e responsabilidades dos governos com relação aos três anos do ensino médio e, na prática, os circunscreve a dois anos (a despeito de todos os impostos pagos para que se possa investir em educação), culpabilizando e responsabilizando os próprios estudantes e suas famílias por qualquer insucesso pessoal e profissional já a partir dos 14 anos ou relegando-os à exploração da força de trabalho e criando mercado de reserva das melhores vagas, desde as grandes universidades públicas até as melhores colocações profissionais, aos filhos e filhas da chamada "elite".

E quando, exaurida e sucateada, a educação pública sucumbir definitivamente, privatizá-la será a galinha dos ovos de ouro das grandes corporações econômicas. Na prática, os filhos dos mais pobres só terão cobertura do estado até os 14-15 anos na área de Educação. Depois, apenas um paliativo, um bota fora, um "dane-se".

Enquanto isso, os filhos dos ricos serão formados de maneira ampla e irrestrita e com oferta de todas as disciplinas em carga horária generosa da qual o sucateado Novo Ensino Médio sequer se aproximará. É o maior genocídio intelectual da história do Brasil. Os responsáveis devem ser punidos e execrados. E entre eles, muitos/as há que ostentam o título de "professor/a".

FELIZ DIA DAS CRIANÇAS?

 

terça-feira, 5 de outubro de 2021

Poema: "Ruflar", de Erivelto Reis

 

Ruflar

Erivelto Reis

 

É porque amamos muito

Que perdemos tanto

Quando o mínimo que esperamos

Não está no fim do romance

Que nos lê...

Só resta virar a página,

Enlutar-se, esquecer.

 

É porque sonhamos muito

E queremos algo que é tão raro:

Um outro ouro puro

E primordial...

Um gesto, um tempo, um perfume,

Um sabor, uma palavra, um som essencial.

 

Eu estava aqui tão atento a tudo

Que nem notei você saindo.

Estava lutando, mesmo estando de luto...

Eu estava voando tão alto

Que nem me senti caindo.

 

É porque sonhamos, amamos e queremos muito

Que aquilo que ainda houver,

E o que tiver havido

Não sacia...

É uma reação tardia,

A uma casa vazia,

Em perpétua quarentena.

Pássaro sem asas,

Ruflar de dar pena.

 

Eu estava voando tão alto

Que nem me senti caindo...

Eu estava imaginando o céu

No exato instante em que desabei no abismo.

 

domingo, 19 de setembro de 2021

Crônica: "Uma historinha sobre Paulo Freire", de Erivelto Reis

 

            Uma historinha sobre Paulo Freire

            Erivelto Reis

                       

 

            Um dos momentos mais emocionantes na minha formação como professor nos bancos da graduação ocorreu em um evento em homenagem a Paulo Freire. Curiosamente, também foi nesse evento que testemunhei uma das grandes violências intelectuais contra o professor Paulo Freire.  

            Esse momento dual que vivenciei contribuiu enormemente para um breve vislumbre da real situação da educação, área em que eu sempre desejei atuar, e para a percepção dos desafios reais a que eu seria submetido como pesquisador e professor, desde o primeiro semestre de meu ingresso na faculdade, na área de Letras.

            Esse fato ocorreu em um evento em homenagem a Paulo Freire, que contaria com a aula magna do proferida pelo professor Moacir Gadotti, presidente do Instituto Paulo Freire, um intelectual de altíssimo nível e um grande amigo do Patrono da educação brasileira.

            Durante todo o mês que antecedeu à palestra, a minha faculdade fez divulgação; os professores e professoras davam exemplos, comentavam artigos; a rede de leitura que havia prescrevia a leitura de Pedagogia da autonomia, o professor e filósofo Flávio Pimentel, na disciplina Filosofia da Educação, nos orientava para o que deveríamos questionar ao lermos a obra e tomarmos conhecimento do pensamento do autor. Muitos/as professores/as experientes, especialmente as que tinham construído carreira também na educação básica, nos falavam de casos pontuais ocorridos em sala de aula em que os métodos e ensinamentos freirianos os/as tinham ajudado e, naturalmente, os seus alunos e alunas haviam sido beneficiados.

            Mesmo antes de ingressar na faculdade, eu sabia que Paulo Freire era importante. Eu sabia que ele havia sido preso. O poeta, meu amigo, Primitivo Paes me contara da mobilização no interior de São Paulo, em prol da alfabetização de adultos operários, desenvolvida a partir do trabalho e do exemplo de Paulo Freire. Eu havia lido no clássico livro de poemas de Thiago de Melo, Faz escuro mas eu canto, com diversos poemas compostos quando o poeta amazonense encontrava-se exilado no Chile, em 1964, o poema “Canção para os fonemas da alegria”, dedicado a Paulo Freire.

            Em resumo, todas as referências de gente que eu admirava, de meus professores e professoras, do pouco que eu conhecia como leitor sobre a vida de Paulo Freire inflamavam em mim as melhores expectativas por aquele momento.         Além do fato de que, por muitos anos, eu aguardara para realizar o sonho de entrar na faculdade e cursar Letras e aquela seria a primeira aula magna de que participaria como estudante. E seria justamente uma aula sobre um professor conhecido no mundo todo e cuja figura eu associava à defesa da educação fraterna e libertadora dos mais pobres e oprimidos e que surgia em meu imaginário, fosse pela poesia de Thiago de Mello, fosse pela fala dos meus professores e professoras, como um Quixote contra a opressão, um nômade em prol da sabedoria, um Betinho da Educação. Na minha ingenuidade, eu achava que ninguém poderia vir a atacar ou teria motivos para a atitude  de desmerecer aquele professor e sua trajetória. Ledo engano.

            Chega a noite da aula magna, auditório lotado, direção da faculdade presente. Todo um protocolo solene para receber o ilustre palestrante. O Professor Moacir Gadotti começa a proferir a aula, lembrando a trajetória e algumas das experiências de Paulo Freire. Projetam-se imagens de Paulo Freire mundo afora, alternadas em dois momentos bem característicos: abraçado e acolhido pelos mais humildes e reverenciado no mundo todo por intelectuais, magníficos reitores de Universidades Históricas e importantíssimas, políticos importantes ligados aos movimentos populares, presidentes de países desenvolvidos, e até mesmo por reis e rainhas.

            Naquela noite, algumas histórias de medo, desafios e inseguranças que Paulo Freire teve que enfrentar aqui em seu próprio país também foram contadas.

            Era incontestável a importância de Paulo Freire para a educação no Brasil e no mundo. No entanto, a violência intelectual a que me referi no início desse texto, se deveu a um grupo de alunos e alunas que no fundo do auditório dizia coisas como: "velho comunista" - algumas fotos de Paulo Freire eram ao lado de políticos notada e reconhecidamente associados à esquerda e às causas populares, tendo sido ele próprio um político, secretário de educação na cidade de São Paulo, na administração de Luiza Erundina, do Partido dos Trabalhadores.

            Ouvi ainda coisas: "aposto que está rico com o dinheiro desses pobres coitados", assim que imagem de Paulo Freire rodeado de crianças, em uma "escola" do interior do interior do Brasil, sem paredes e sem qualquer mínimo recurso de infraestrutura para sua função de escola, apareceu no telão. E não adiantava dizer que Paulo Freire dedicou sua vida, correu diversos riscos ao contrariar os poderosos, os militares, os corruptos. Os insultos irreproduzíveis aqui continuaram durante toda a palestra.

            Aquela situação foi de uma crueldade e de uma violência traumatizantes e reveladoras dos inúmeros desafios que dali para diante eu precisaria enfrentar como educador adepto da pedagogia da autonomia, da pedagogia da fraternidade. O tempo, infelizmente, se encarregaria de provar que minha preocupação era legítima.

            Após a aula, no espaço dedicado aos comentários de professores/as e alunos/as, a cada comentário elogioso que destacasse a importância de Paulo Freire, o mesmo grupo de alunos e alunas no fundo do auditório permanecia irredutível e nada os demovia dos comentários sarcásticos e agressivos contra a memória e o legado freiriano.

            Notem que não era uma posição baseada em nenhum contraponto pretensamente teórico, como eu teria a oportunidade de testemunhar algum tempo depois, num evento na Bienal Internacional do Livro no Rio de Janeiro, que contava com a presença da professora Nita Freire, viúva do educador. Também nessa ocasião, alguns insultos foram proferidos, a despeito do reconhecimento mesmo dos desrespeitosos interlocutores à obra de Paulo Freire.

            Lembrei-me, naquele dia, da frase célebre do professor Darcy Ribeiro que afirmava que havia um projeto para que a educação não prosperasse no país. Ao perceber e testemunhar, mais uma vez, o ataque à memória, à obra e à trajetória de Paulo Freire entendi que o perverso projeto a que o professor Darcy Ribeiro se referira, basicamente poderia ser resumido em três eixos: a) não deixar educar; b) dificultar ao máximo a quem eduque; e c) atacar e desvalorizar os/as educadores/as, sua formação e sua biografia, mantendo-os/as tensos/as e inseguros/as e sempre justificar a insanidade e a violência dos ataques com a pretensa defesa dos interesses dos/as educandos/as.

            Voltando à aula magna: terminada a conferência, muitos alunos e alunas correram para voltar pra casa depois de um dia exaustivo de trabalho, felizes com a magnifica aula. Aqueles/as, do grupo que manteve-se fechado ao que era ensinado e insultando o educador, se foram ainda debochando e afirmando que se não fosse pelas horas de atividade complementar jamais estariam ali. E os/as alunos/as, como eu que podiam aguardar, entraram na fila para cumprimentar e solicitar uma foto e um autógrafo do maravilhoso professor Moacir Gadotti.

            Quando chegou a minha vez, todo formal, agradeci ao professor Gadotti e falei a ele, brevemente, da importância daquele que era o meu primeiro grande evento acadêmico. Disse a ele que eu era garçom, mas que sempre quis ser professor e que me comprometia com ele a, a partir daquele momento, tentar colocar em prática na minha carreira, ainda em construção, a pedagogia da fraternidade e da autonomia que percebi no relato sobre a vida e a obra de Paulo Freire. Ainda formalmente, estendi a mão para um cumprimento ao professor Gadotti, que sentado à mesa, acabara de me autografar o folder do evento – eu não tinha dinheiro para comprar um exemplar de um dos livros à venda naquele dia –, ao que ele levantou-se e disse:

            – Me dá aqui um abraço. Por mim, em apoio a um futuro colega de profissão. E, certamente, porque seria essa a atitude de Paulo Freire, diante de uma história como a sua.

            Salve o centenário de Paulo Freire, o educador que nos ensinou a buscar e valorizar a nossa liberdade e a não desistir de encontrar a nossa felicidade.

sábado, 18 de setembro de 2021

Poema: "Reglus", de Erivelto Reis (Homenagem ao Centenário de Paulo Freire)

 

Reglus

 Homenagem ao Centenário de Paulo Freire

 (a partir de Ferreira Gullar e Thiago de Mello)

 Erivelto Reis

 

Ao menor sinal do seu nome,

Que o opressor se esgueire

Que brotem flores de esperança

Por léguas e mais léguas,

Em todo e qualquer alqueire,

Em cada pedaço de chão,

Patrono da Educação,

Nosso amigo, nosso irmão,

Professor Paulo Freire.

 

Seu nome é a Pedagogia precisa

Para quem quer autonomia,

Para quem está oprimido...

Que a sua história e sua luta,

São lume que nos libertam,

Inspiram-nos a mudar nosso destino,

Para que a vida melhore,

Para que ela se ajeite...

Exemplo de retidão,

Professor Paulo Freire.

 

Seu nome é símbolo,

Da importância de ler o mundo

E conquistar independência

É bússola que indica o rumo

É errância, sensibilidade, competência.

Eis um defensor da infância,

Eis um defensor da escola,

Eis um defensor da ciência.

 

Quero dizer seu nome,

Celebrar o seu centenário,

Que as suas lições podem mudar

O destino de nossa gente,

Pelo quanto você foi visionário,

Pelo quanto você foi solidário

Aos mais humildes, aos desamparados.

 

Quero dizer seu nome,

Mestre da afetividade no ofício da Educação,

E de todo o bem que nos beire.

E é do seu legado, companheiro,

Que o país ainda tem precisão.

   

Eu quero dizer seu nome, Paulo Freire,

Para que a vida valha a pena

Para que o mundo se enfeite

Para que a esperança prospere

Para que ninguém a rejeite.

 

Porque a vida ainda é linda,

Ainda é flor que se cheire!

Quero dizer seu nome,

Patrono da Educação,

Orgulho dessa nação,

Nosso Professor Paulo Freire.

quarta-feira, 8 de setembro de 2021

Texto: "O Ultimato", de Erivelto Reis

 

O ULTIMATO

Erivelto Reis

 

            É só procurar no dicionário:

1.

num processo de negociação diplomática, exigência, pedido ou proposta final cuja rejeição acarretará o fim das conversações e o uso de uma ação direta.

2.

na guerra, comunicado enviado por um chefe militar ao inimigo exigindo rendição imediata, sob ameaça de obtê-la por meios mais violentos.

            Ele não é louco, seus seguidores se prepararam, há uma grande rede de controle e manipulação de uma legião de escudos humanos que serão usados inclusive em situações de conflito e litígio bélico e físico; seus apoiadores dispõem de recursos que incidem por todos os setores, especialmente, sobre energia, abastecimento e estrutura econômica do país e suas forças contam com mercenários de toda ordem em diversas frentes e em diversos escalões.

            A ponta do iceberg, num grito ao enfrentamento entre pessoas da mesma nacionalidade, a começar pela manifesta declaração de desobediência constitucional e desafio declarado aos demais poderes - notadamente, ao Supremo Tribunal Federal e ao Tribunal Superior Eleitoral, foi o que vimos ontem. Há uma gigantesca montanha no fundo desse mar de lama.

            Os quase 600.000 mortos não sensibilizam essa gente. Milhões de desempregados, a volta da inflação, a perda de garantias mínimas para os trabalhadores, as sucessivas tentativas de desmonte da Universidade Pública, do SUS, da Educação básica, a miséria e a violência não sensibilizam ou desmobilizam essa gente.

            Seus discursos falsos e odiosos vão se infiltrando e ganhando ares de verdade e de naturalidade entre os entes de nossas famílias, pessoas as quais amamos e respeitamos e fazendo com que, ainda quando não se tornem adeptos/as da totalidade do que essas ideias representam, tendam a racionalizar, naturalizar ou pesar prós e contras.

            NÃO HÁ NADA FAVORÁVEL NUM GOVERNO QUE SE SUSTENTA PELA MENTIRA, PELA HIPOCRISIA, PELA CORRUPÇÃO E POR AGIR DELIBERADAMENTE EM FAVOR DE SEUS COMPARSAS E CONTRA OS INTERESSES DO PRÓPRIO POVO.

            Suas mensagens, destinadas a um grande público, são semântica e semioticamente construídas por especialistas para parecerem neutras, naturais, moralmente e teologicamente embasadas, surgidas de reflexões, do desejo de entendimento, são recorrentes nos anúncios do youtube, circulam nas diversas redes sociais, nas redes de TV abertas, compradas com dinheiro público, via veiculação de anúncios institucionais do próprio, nos grupos de aplicativos de mensagens, em diversos tipos de púlpitos de diferentes denominações.

            Sabe-se da existência e da utilização das chamadas fake news, montagens de aúdio, de fotos e vídeos que circulam a uma velocidade e num volume impressionantes. São como grande arma de propaganda e satanização das entidades, dos servidores, dos opositores, da educação e dos poderes que ainda têm condição de enfrentar e desarticular essa gente perversa.

            Para grupos mais específicos em igual velocidade e volume, circulam mensagens mais ácidas, agressivas, ferozes, mordazes, bélicas, incisivas, conclamando o combate aos opositores, visando à sua derrota e ao seu silenciamento.

Como combater a tia que vem da reunião com uma mensagem falsa compartilhada por outra tia nessa mesma reunião? Uma violência travestida de piada, contada por um colega de trabalho, por um familiar querido, ou as práticas de um professor que não fala diretamente, mas que vai apagando textos, autores, personalidades e temas fundamentais para o esclarecimento de seus alunos e alunas, sorrateiramente, num crime intelectual devastador?

            Como, numa reunião em família, num almoço de domingo, manter-se calmo, quando um parente, um familiar, tenta comparar um político genocida, apoiador de torturadores, cercado de forças militares e paramilitares, eleito a base de disparos de robôs com todo tipo de mentira asquerosa, com o governo de uma presidenta democraticamente eleita e que foi derrubada num golpe que uniu legislativo, o seu próprio vice-presidente, setores econômicos movidos por interesses multinacionais e até mesmo o judiciário?

            NÃO HÁ COMPARAÇÃO!!!

            Recebemos um ULTIMATO ONTEM. Os quase 600.000 mortos são uma clara e inequívoca demonstração de que essa gente não está nem aí para o país e para o povo brasileiro.

            Não fosse a pandemia, a inflação, a retirada dos direitos trabalhistas, a perseguição à ciência e à educação, ao funcionalismo, as sucessivas provas de enriquecimento ilícito dessa família nefasta e seus asseclas, a confirmação incontestável de que um político brasileiro, ex-presidente por dois mandatos, foi perseguido e preso com uma peça judicial montada por um juizeco sem escrúpulos, a mando de poderosas forças econômicas e políticas internacionais, para que esse ex-presidente não disputasse as eleições. Há ainda o aparelhamento das estatais e do governo brasileiro por militares hediondos e incompetentes até a raiz dos cabelos, etc., etc., etc., Todas essas coisas já seriam provas definitivas de que não há interesse, amor, respeito, consideração por nada que tem qualquer relação com a sociedade brasileira e com qualquer princípio de lisura, diplomacia ou soberania de nosso país.

            ESTE HOMEM E OS QUE NELE VOTARAM E OS QUE AINDA O APOIAM NOS CONDENARAM A TODOS.

            Se nada for feito imediatamente, sucumbiremos. Mais hoje, mais amanhã...

            Enganam-se os que esperam expurgá-lo, e à sua dinastia, pelo resultado nas urnas. Se houver resultado nas urnas e mesmo que haja, seu ódio à diversidade, às minorias, aos mais pobres, à democracia e ao Estado brasileiro forjou e alinhou milhares de indivíduos perversos em seus interesses e em suas práticas que usam o poder que tenham: dinheiro, influência pessoal, profissional, familiar, religiosa, para disseminar mentiras ou o atraso travestido de conservadorismo. Por que diabos conservaríamos o que historicamente só nos tem feito mal como sociedade?

            Percebam: a morte dos povos originários, a escravidão, o machismo, os preconceitos os mais diversos, a exploração dos trabalhadores, a destruição de nossa natureza, a expropriação de nosso patrimônio e de nossas riquezas, os golpes contra a democracia, as ditaduras, as torturas, as violências, a discriminação, a desigualdade social, a morte... POR QUE UMA PESSOA OU ALGUMAS MILHARES DE PESSOAS OU ALGUNS PARTIDOS POLÍTICOS SE DEDICARIAM A CONSERVAR ESSAS SITUAÇÕES TÃO CARACTERISTICAMENTE PERVERSAS DA HISTÓRIA DO NOSSO PAÍS?

            APENAS PARA PERMANCEREM NO PODER.

            Poucas famílias dominam o sistema financeiro, os meios de comunicação, algumas famílias se tornaram donas de áreas de terra equivalentes a países da Europa, com o hectare fixado a preço de décimos de centavo e ainda assim com isenção de quaisquer tipo de impostos. Só pra citar alguns exemplos do que essas pessoas realmente querem conservar.

            Agora notem: são conservadoras para enriquecerem e se protegerem - legalmente inclusive - e liberais com tudo o que for coisa pública com a qual possam angariar algum tipo de lucro ou benefício. Para isso não têm escrúpulos. Estas famílias perpetuam-se no poder político formando clãs, dinastias, comprando, financiando, modificando leis para se beneficiarem e colocando no poder ou tirando dele quem bem quiserem e definindo se e como e de que jeito municípios, estados e o país vão ou não se desenvolver.

            Recebemos ontem um ultimato e as histórias mais cruéis de nossa trajetória como povo esbofeteiam nossa cara. E, se nada for feito, este não será o último golpe que receberemos.