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Poeta - escritor - cronista - produtor cultural. Professor de Português e Literaturas. Especialista em Estudos Literários pela FEUC. Especialista em Literaturas Portuguesa e Africanas pela Faculdade de Letras da UFRJ. Mestre e Doutor em Literatura Portuguesa pela UFRJ. Nascido em Goiás, na cidade de Rio Verde. Casado. Pai de três filhos.

domingo, 22 de setembro de 2024

Poema: "Pluft", de Erivelto Reis

 Pluft

Erivelto Reis
Não vá cair na asneira
De abrir a porta da alma
Pra um amor fantasma.
Ele não tem medida, nem mente,
Ele não tem medo de nada.
Dá uma trabalheira danada.
Tem gente que zomba,
Leva na brincadeira.
Mas o amor fantasma
Se perde pela casa,
Mexe em suas gavetas,
Bagunça tua prateleira,
Vigia tua noite,
Esvazia o sentido dos teus dias.
Amor fantasma é um amor
Assassinado pela rotina,
Um amor desencantado
(Quase) sem vida,
Que não viceja,
Daí se vinga
Amando ainda,
Onde quer que esteja!
Às vezes, amando mais ainda...
Sem ir embora,
Perambulando no entorno
Do desalmado amor
Sadoestoicista,
Mas sem partida.
Amor fantasma
Não é um amor qualquer
É um amor que aprendeu
A ser voyeur, mas não aprendeu a voar.
Que se acostumou a cair,
Mas não aprendeu a partir...
Que descobriu na marra
A longa distância do "perto".
É um amor banido
Do mundo do desejo dos vivos...
Que quer voltar a dormir
Na companhia do seu afeto,
Na companhia do ente amado.
Não vá abrir a porta da alma
Pra um amor fantasma.
Pois o que sobra do desamor
É um amor mal assombrado.

Poema: "Ponto-de-vista", de Erivelto Reis

 Ponto-de-vista

Erivelto Reis
Eis que chega um tempo,
Um estranho agora,
Em que todo pensamento
É forjado de memória:
Essa labareda subjetiva
Que brinca
De esconde-esconde
Entre um lóbulo,
Um átrio e a alma,
É uma identidade secreta,
Que o indivíduo ostenta,
Esconde e carrega.
Roupa de gala ou pantufa rota.
Queima, algo febril,
Silencioso ardil
De bis para a dor ou prazer.
Parece emanar de nós,
Mas nós é que existimos nela.
Abre dessa forma
Uma paisagem e uma janela
Um ciclo, uma aliança, um elo
Entre lembrar e imaginar,
Entre criar e duvidar,
Entre um tango e um fado.
Entre um cheiro, um gosto,
Uma sensação de já ter vivido...
De se lembrar ou se esquecer
Um trauma, uma voz, um rosto.
Parece um cúmulo
Que haja memória
Que seja, ao mesmo tempo,
Nascimento, florescimento e túmulo.
Jazemos ilhados
Mergulhados no passado,
Como numa sexta-feira
Cheia de morangos mofados...
Ou entre o que conquistamos
E o que perdemos
Sem saber que era conquista.
Há dias em que o pensamento
É quase todo memória...
Mas isso é apenas
Um mero ponto-de-vista.

Crônica: "Os donos de tudo", de Erivelto Reis

Sobre a expulsão dos estudantes na UERJ e outros desmandos do governo do Estado

Erivelto Reis

Terceira semana de setembro de 2024

 Invadindo (ou adentrando com um "documento") a universidade a poder de polícia pra expulsar estudantes; desvinculando receita de royalty da indústria do petróleo da obrigatoriedade do direcionamento do pagamento prioritário de aposentados e pensionistas;

superlotando o serviço público de contratações temporárias que precarizam ainda mais o serviço, o trabalhador contratado e o funcionalismo;
torrando o dinheiro do Fundeb e da venda da CEDAE em "projetos" (pra inglês ver), que canalizam para empresários o dinheiro que deveria servir pra valorizar os servidores e melhorar de fato as condições das escolas;
aplicando técnicas de verificação de marcadores de "qualidade" na educação oriundos de esquemas abandonados pela iniciativa privada norte-americana dos anos 60 do século passado;
implementando ou permitindo a gestão remota das unidades escolares ou permitindo modelos de gestão em diversas unidades, à maneira do que se pratica na iniciativa privada, onde as escolas têm um dono e os diretores são chefes...
Isso tudo ocorrendo na cara de um governo federal de esquerda, eleito por pessoas que resistiram e prantearam seus mortos no massacre de brasileiros e brasileiras ocorrido durante a COVID, permitido e articulado por um governo raivoso de extrema direita.
O governo federal, como sabemos, não governa o estado do Rio, mas as verbas do MEC ajudam a pagar o salário dos servidores estaduais da educação. É preciso olhar o que os governadores estaduais têm feito.
Esse atual governo federal de esquerda não derrubou o hediondo novo ensino médio, que serviu e serve aos interesses da direita, quando deveria implementar uma política de Estado de educação democrática e igualitária e preferiu o "jogo político". Nitidamente o Novo Ensino médio amplia as desigualdades e o atual governo não devolveu a carga horária das disciplinas "tradicionais" pertinente e adequada à real formação dos filhos e filhas da classe trabalhadora.
O atual governo de esquerda que se mantém omisso ou a passos de tartaruga em relação à censura de obras em diversas redes estaduais e ao descontrole do que ocorre nas práticas e condições de trabalho e formativas do ensino fundamental em todo o país.
Evidentemente, o atual governo de esquerda, não se iguala ao governo anterior de forma nenhuma. Mas não está isento de crítica. Merece, por parte daquelas pessoas, como eu, que entendem que ser de esquerda é lutar contra a barbárie e os privilégios de uma classe dominante e daqueles que a emulam ou se ufanam de se prestar à violência e à covardia que ela promove, um pedido de maior e melhor atuação, atenção e sensibilidade para a compreensão do que significa sobrepor um modelo ideal de governabilidade a determinadas áreas carentes de transformação e articulação, como a educação, por exemplo, pelo que representam para a soberania do país. Ou seja, com algozes da educação, inimigos dos estudantes e dos servidores não há acordo, nem se permite que suas violências cheguem a se realizar ou que não sofram sérias e exemplares consequências. Expulsar estudantes a poder da força policial é inaceitável. Mais uma das inaceitáveis práticas de partidos e figuras políticas perversas que há décadas governam o estado do Rio de Janeiro, mas agem como se fossem seus donos.

terça-feira, 10 de setembro de 2024

Poema: "Sermão do afastamento do ser violento", de Erivelto Reis

 Sermão do afastamento dos violentos

Erivelto Reis
São três os desejos do ser violento:
Poder,
Silenciamento,
Exclusividade.
Usados como degraus
Para uma ascensão
Que o distinga,
Que o proteja até a blindagem,
Que o destaque, impedindo-o
De regressar para o espaço
De onde não deveria ter saído.
É seu habitual prazer
O manejar do poder para o silenciamento
De contrários e contraditórios.
Eis um dos mandamentos
Da bíblia perversa dos violentos.
Evidentemente, há violências
Praticadas por todo tipo de gente.
Dos omissos aos coniventes,
Que chamam os que se rebelam
Contra os violentos
De inconvenientes.
Mas as violências praticadas
Pelos que têm como credo
Essa tríade:
(Poder, silenciamento e exclusividade),
São ostensivamente
Utilizadas para aferir
Sucessos efêmeros,
Nos quais o ser violento
Pretende uma simbiose,
Fundindo-se com o cargo
Que ocupa.
Assim, tenta esconder o recalque,
A frustração e a insegurança
Que, secretamente,o consomem.
Dele, dir-se-ia incapaz
De cometer o mal.
Eu refuto:
Incapaz talvez do mal sem álibi forjado,
Incapaz talvez do mal
Sem atribuir culpa
A quem quer que seja,
Incapaz do mal
Sem ser incapaz do bem
Por desinteresse.
O violento lê o jornal
Por sobre o seu ombro
E passaria por sobre o seu cadáver
E forçaria a sua depressão, Burnout,
Até que você se sentisse
O primeiro dos impostores,
A última das criaturas,
Ou se atirasse do alto da ponte.
Contamina seu fim de semana
Com o medo e a incerteza...
E a sua semana
Com o assédio e a opressão
Dissimulados e administrados
Em doses cada vez maiores e letais.
Dele, a eficiência se declama
Com números rearrumados.
E se o olharmos atentamente,
Veremos que crê na pantomima
De sua qualificação, no mamulengo
De suas habilidades.
Seu bom dia é rançoso.
Seu hálito enjoa.
Máquina sem engrenagem
Oco, tosco, fosco.
Opaco vulto,
Mágoa em pessoa.