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Poeta - escritor - cronista - produtor cultural. Professor de Português e Literaturas. Especialista em Estudos Literários pela FEUC. Especialista em Literaturas Portuguesa e Africanas pela Faculdade de Letras da UFRJ. Mestre e Doutor em Literatura Portuguesa pela UFRJ. Nascido em Goiás, na cidade de Rio Verde. Casado. Pai de três filhos.

quarta-feira, 18 de agosto de 2021

Crônica: "House", de Erivelto Reis

 

HOUSE

Erivelto Reis

                Gregory House é um personagem de uma série de Televisão. Foi vivido brilhantemente pelo ator Hugh Laurie. Milhões de pessoas no mundo inteiro conhecem esse personagem que é um médico especialista em diagnósticos, que manca de uma perna e que devido a uma complicação cirúrgica passa a ser acometido por dores intensas e crônicas desde então. Viciado em Vicodin, misantropo, pautado na premissa de que “todo mundo mente”, sua especialidade é ler os outros.

                Cícero César foi o House possível que conheci. Descartados os problemas e idiossincrasias do personagem da ficção, considerada a forçada aproximação entre o tipo físico do personagem e do professor, o que torna o match possível realmente, além do grande talento em sua área (um grande médico na ficção em comparação a um talentoso professor na vida real) é a capacidade que Cícero tem para ler as pessoas. As lê bem. Com detalhes. Com rigor. Mas com justiça, poesia e bondade.

                Apelidá-lo de House, foi o reflexo do dom que percebi nele em diagnosticar bem os livros, as pessoas, os poemas, as canções, os textos verbais e os não-verbais. Cícero lê gestos, lê atitudes, lê expressões. É tão bom nisso que em alguns casos, chega a prever as reações e as consequências de determinados comportamentos e atitudes. Há também alguma impaciência nos dois House.

                A recente série de textos que Cícero escreveu e que trouxe do baú de nossa memória e do ninho de nosso carinho as figuras de Marinete, Andréa, Umberto, Cléber, amigos e amigas tão queridos/as, seguindo-se aos textos, uma sequência de comentários repletos de expressões de saudades, das reminiscências por um tempo em que convivemos e me fez pensar no personagem e no professor.

                Os textos também resgataram as lembranças de uma convivência coletiva resultante da convergência de tantos talentos reunidos, do respeito construído pela amizade, camaradagem, admiração e a noção implícita de que cada qual possuía um milhão de qualidades para estar onde estava. E isso nos bastava. Uma noção confortável de que o outro era e é especial independente de qualquer especialidade. Especial em essência. Não há lugar no lattes pra escrever essas qualidades.

                Cícero/House evocou de nossos corações o teatro infantil - algo ingênuo - de nossa convivência repleta de humor, cordialidade, profissionalismo, mesmo em presença de graves crises que suportamos juntos. Num momento em que confiamos mutuamente em cada um dos companheiros/as, por causa das qualidades deles/as e com eles/as contamos até quando foi possível.  Cícero nos levou de volta com seus textos sobre nossos amigos tão queridos ao locus amoenus de uma época em que cada qual foi e continuou sendo importante na lembrança de nossos corações, na fraternidade de nossa convivência.

                Os textos que escreveu e aqueles que tenho esperança que ele vá escrever deixaram claro para mim que Marinete sempre será a Marinete de nosso carinho, da memória de uma realidade profissional e amistosa que partilhamos... e o mesmo, por extensão à Andréa, ao Umberto, à Lucy, ao Jayme, ao Alzir, ao Cléber, à Marcinha, à Gilda, ao Flávio, ao Marcos Dias (que chorou diante de mim quando eu fui sendo embora), à Bruna, à Jane, à Janice, à Aparecida, ao Heleno, à Lya, ao Zé Ricardo, ao Mauro Lopes, ao Mauro Ferreira, ao Antônio Paulo, ao Sérgio, à Margarida, à Neide, ao seu Francisco, ao Miguel, à Miriam, ao Gérson, à Adriana, ao Ricardo, ao Rivelino, ao Anderson, ao Marco Antonio,  ... e tanta gente tão querida...

                Cícero diagnostica, medica e ameniza a saudade com sua poesia, com suas crônicas, com sua escrita. Estimula a todos/as nós, personagens daquela série e também da vida real, com as suas palavras e sua sensibilidade, apesar e a favor de nossos espantos. Suas recordações são em nosso ânimo os anticorpos que produzirão em nós as defesas para continuarmos lutando e acreditando na confiança, na palavra e na beleza de gestos e ações.

                Talvez seja certo pensar que na série e na vida, não se pode sair ileso da dor e do sofrimento. House cura a dor dos outros enquanto a sua própria dor o machuca. Segue trabalhando, mesmo quando seu trabalho é questionado. É insultado por pessoas que mentem e mentem e continuam mentindo até que seja possível garantir apenas o seu próprio benefício. Não porque não saibam que o que dizem seja mentira. Mas porque não tenham competência para construir o novo e o melhor pelo coletivo. Na série como na vida.

                Agradecer ao House/Cícero é pouco pela alegria que suas crônicas trouxeram ao meu coração ao homenagear nossos/as amigos/as.

                Anos depois de terminada a última temporada, acompanho o ator e vejo o personagem em cada novo trabalho e aplaudo de pé sempre que há uma nova estreia. E sempre há. E as reprises também ensinam.

                Mas eis que, de repente, Cícero escreve um novo episódio.

                 

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