Morrente
Erivelto Reis
Porque eu nunca vi você,
Mas li sua tese e pensei que...
A morte é perder tudo
O que a memória não pode mais tocar,
Tudo o que a alma não pode mais sentir...
A morte é perder sem competir.
Precipício sem princípio e sem fim,
Um portal pro antes e o depois de cada um de nós,
Um grito estarrecido e sem voz
Na consciência do que nós só somos quando nos vemos sós.
A morte é o ocaso de todos os sóis.
Eu estava caminhando no quintal do mundo,
Numa trilha de sonhos sem imaginação que eu criava,
E de repente a sua imagem assaltou meu dia:
Era o jeito como você falava, o jeito todo seu de só ficar
na sua.
A morte é ser o único menino sem infância no raio da sua
rua,
O único insone na noite das inquietações da vida.
Irmão na dor de desconhecidos,
Esquecido na dimensão de seus sofrimentos.
Ator representando mal o drama de seus infortúnios.
Senhor de nada, expulso de seus domínios.
Choro, mas não escorre a lágrima,
Dói em mim a falta de quem vive,
Dói em mim a presença de quem morre.
Peço ajuda, silencio, escrevo e sucumbo porque a vida
para!
Um vinco de erosão e tristeza
Marca para sempre a estrada da minha cara.
Alguém estranho ou conhecido não me venha dizer
Que o tempo cura tudo e que tudo sara...
A morte é o estado de sítio, de coma e de choque
Daquilo que era um mundo
E desmorona aos primeiros acordes,
Não importa a melodia, a semântica, a sintaxe,
Da notícia da trágica verdade anunciada.
Eu estava longe e estava perto quando eu soube:
E depois disso eu nunca mais soube direito de nada.
Perdi o rumo da vida, perdi o rumo de casa.
Implodi, ruí, caí, cabum!
Depois disso, nem mais um minuto,
Nem mais um segundo! Nenhum...
A morte de quem amamos não nos redime,
Antes, define o fim da pré-história
Na vida de cada um.
É perder tudo
O que a memória não pode mais tocar,
Tudo o que a alma não pode mais sentir...
A morte é perder sem competir.
Nenhum comentário:
Postar um comentário