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Poeta - escritor - cronista - produtor cultural. Professor de Português e Literaturas. Especialista em Estudos Literários pela FEUC. Especialista em Literaturas Portuguesa e Africanas pela Faculdade de Letras da UFRJ. Mestre e Doutor em Literatura Portuguesa pela UFRJ. Nascido em Goiás, na cidade de Rio Verde. Casado. Pai de três filhos.

sexta-feira, 1 de novembro de 2019

Reunião, poema de Erivelto Reis







Reunião
Erivelto Reis

Pagamos os bancos esse mês?
Claro! Pagamos.
Parabéns.
E os funcionários e funcionárias?
Que esperem.
(Parabéns.)
Pagamos os bancos esse mês!
Mas eles podem esperar?
Se não esperarem empregados, esperarão desempregados.
Mas nós temos o direito de fazer isso?
Não temos dinheiro.
Mas não estamos pagando aos bancos?
Claro que estamos.
E os salários atrasados desses funcionários e funcionárias?
Pagamos os bancos esse mês.
E as famílias deles e delas,
Que estão passando por dificuldades?
Pagamos os bancos esse mês!
E no mês passado... e no outro mês...
Não deixamos de pagar os bancos nenhum mês.
Mas por que fazemos isso?
Para não pagarmos mais juros.

E o que acontece enquanto funcionários e funcionárias não recebem?
Eles pagam juros.
E quando recebem?
Pagam os juros da dívida que contraíram
Por não haver recebido no tempo que deveriam.
Mas nós pagamos os funcionários e funcionárias?
Ocasionalmente. Parcialmente. Às vezes, integralmente.
(Antigamente era sempre).
E, de uns tempos para cá, principalmente, na justiça.
Mas não é mais justo e ético
Pagar funcionários e funcionárias conforme a lei?
É! Mas na justiça, ganhamos tempo.
Para quê?
Para pagar os bancos.
E as outras dívidas que temos...
Que outras dívidas?
Trabalhistas, por exemplo.

Por que temos dívidas trabalhistas?
Porque não estamos pagando os funcionários e funcionárias que temos.
E os que tivemos?
Demitimos. Porque não gostavam que não os pagássemos.
Ou se demitiram. Porque não gostavam que não os pagássemos.
Ou porque não puderam mais suportar a forma como os pagávamos.
Mas nós pagávamos...
De um jeito que eles não gostavam.
Por isso os estamos pagando na justiça
Com o trabalho dos funcionários e funcionárias que temos.
E que não estamos pagando.
Mas pagamos os bancos esse mês.
Mas os funcionários e funcionárias não reclamaram?
Reclamaram!
E nós, o que faremos?
Pagaremos quando pudermos.
Aos bancos?
Não, aos funcionários e funcionárias.
E se eles protestarem?
Os bancos?
Não, os funcionários e funcionárias.
Pagaremos os bancos esse mês.
E se ainda assim  os funcionários e funcionárias reclamarem?
Otimizamos.
Aconselhamos.
Orientamos.
Avisaremos.
Demitiremos.
E pagaremos os bancos esse mês.
Mas nossos funcionários e funcionárias não são bons?
São. Porque os coordenamos.
Porque os dirigimos.
Porque fazem o que mandamos.
Porque esperam mesmo quando não os pagamos.
Mas há os ruins?
Há. Sobretudo, aqueles que não concordam
Com o fato de que não os pagamos na forma como a lei determina.

Por que devemos tanto aos bancos?
Não devemos, estamos pagando.
Por que devemos tanto aos funcionários e funcionárias?
Porque estamos pagando aos bancos...
E ( só porque a justiça manda) aos funcionários e funcionárias que tivemos
E que não pagávamos quando os tínhamos.
Planejamento para o futuro?
Tentar convencer os insatisfeitos, demitir os descontentes,
Contratar novas frentes, novos ares,
Gente mais alegre.
Mas se pagarmos os nossos funcionários e funcionárias regularmente,
E os respeitarmos, reconhecermos sua capacidade, seu talento,
E lhes dermos melhores condições de trabalho,
Eles também ficarão satisfeitos.
É. Mas aí saberemos as caras feias que fazem.
E teremos a recordação das reclamações que fizeram quando não os pagávamos.
E eles terão para sempre a memória do que sofreram.
Não dá para confiar.
Progresso também é isso:
Produzir memórias ruins
Em pessoas boas diferentes ao longo de várias épocas.
E conseguir pagar os bancos.
E quando a dívida com os bancos acabar?
Todo o resto terá sido lucro para nós.
A reunião de hoje foi produtiva.
Embora haja muitos meses
A pauta tenha sido sempre a mesma.




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