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Poeta - escritor - cronista - produtor cultural. Professor de Português e Literaturas. Especialista em Estudos Literários pela FEUC. Especialista em Literaturas Portuguesa e Africanas pela Faculdade de Letras da UFRJ. Mestre e Doutor em Literatura Portuguesa pela UFRJ. Nascido em Goiás, na cidade de Rio Verde. Casado. Pai de três filhos.

segunda-feira, 5 de julho de 2021

Texto: "Sobre a reabertura das escolas do Estado durante a pandemia", de Erivelto Reis

"Sobre a reabertura das escolas do Estado durante a pandemia"

 Erivelto Reis

           

            Nesse exato momento, há mais de 50 municípios do Estado do Rio de Janeiro cujas escolas da rede estadual estão sendo usadas como propagadoras do vírus da Covid.

            Seus funcionários e funcionárias, professores e professoras, alunos e alunas sendo submetidos/as à exposição, à propagação ao contágio e à doença. Quem será responsabilizado por isso?

            Entre a casa e a escola, o vírus vai na mochila, no uniforme, na máscara usada de forma inadequada, subtraída ou ausente até que, num teatro patético, seja colocada diante do portão da escola para burlar grotescamente as recomendações mais básicas de saúde pública.

            Pais e mães negacionistas, assintomáticos, convalescentes da doença vão à porta das escolas de bicicleta, a pé ou de carro, e alguns aproveitam e usam do mesmo expediente de usar a máscara apenas para fingir submeter-se a uma exigência legal, e não por respeito à vida dos profissionais da educação, ou às vidas humanas, para solicitarem atendimento na secretaria das escolas ou junto às equipes de direção e de coordenação. O vírus circula poderoso e onipresente como um deus da morte. Quem vai responder por isso?

            Na saída da escola, depois de um turno de aula, dezenas de alunos subtraem as máscaras, se aglomeram, se cumprimentam e esperam o ônibus que os levará e aos vírus de volta para as suas casas, direto para a destruição dos pulmões de seus familiares ou para a ruína de famílias inteiras.

            Pressionados pelas coordenadorias metropolitanas, colegas convocam colegas a comparecerem às unidades escolares em municípios onde as taxas de contágio estão altíssimas para que retirem ou tenham contato com avaliações em papel, oriundas de casas e de lugares onde possivelmente haja exposição ao vírus. Esses papéis são arremedos de avaliação apenas para livrar a cara do governo, de seu secretário e assessores quanto à ineficácia, ineficiência e desinteresse pela educação pública. Quem vai responder por isso?

            Assim, o professor tem sua jornada duplicada, triplicada, seus recursos particulares – seu computador, seu celular, sua internet, sua eletricidade, por exemplo –, utilizados pelo governo sem qualquer compensação, sua jornada de trabalho ampliada indefinidamente conforme a demanda – trabalha na escola, na plataforma on-line, no celular, na correção de material impresso e na correção dos trabalhos virtuais, em reuniões as mais diversas.

            Verifica-se que a categoria profissional fica dividida, categorizada, rotulada – os cordatos e empáticos X os criadores de caso e briguentos/as – explorada, fragmentada pela ação de colegas que se veem obrigados/as a reproduzir discursos em grande parte sem qualquer fundamentação didática ou pedagógica e com altíssima característica de assédio moral ou de demagogia política (alerta de spoiler: pode haver casos de profissionais que reproduzam tais discursos porque concordam com eles), mas que disfarçam com o uso de mensagens tóxico-positivas e textos passivo-agressivos.

Quem vai responder por isso?

            Nesse momento o governo se aproveita mais ainda para atacar o funcionalismo, para criar mecanismos para nos punir ostensivamente ou através de retaliações. Fecha turmas, registra de 12 a 15% a mais de alunos e alunas do que a legislação permite a cada turma nos diários das turmas virtuais (e olha que a legislação em educação pública no Brasil está entre as mais perversas do mundo). Isso significa que a cada dez turmas o governo fecha uma. Mas eles vão chamar a isso de “otimização”.

            Enquanto o contágio se espalha e ainda não há vacina para todos, o governo diz à população que está pagando auxílio-tecnologia para os professores,  enquanto obriga colegas a trabalharem diuturnamente para manterem as escolas abertas. Assim, os profissionais permanecem sob risco elevadíssimo de contágio, cumprindo funções burocráticas, administrativas inerentes não apenas à gestão da escola, como também a carências de apoio a questões de seguridade social que o governo cumpre mínima e forçadamente através da exploração da mão de obra desses profissionais, tendo as unidades escolares como referência.

            Abandonados, há um grupo gigantesco de alunos e alunas excluídos/as, cujas famílias os querem em segurança e sabem que seu futuro está comprometido pela omissão histórica e pela ausência absoluta de uma política inclusiva de educação remota no contexto pandêmico.

            E há aqueles e aquelas que já não estavam nem aí para a ideia de educação e escola como uma via real de acesso à formação, à cidadania e à inclusão. Influenciados por líderes os mais diversos, por mentiras, fake news... Para esses casos registram-se práticas tais como, qualquer coisa, trabalhos feitos e entregues de qualquer jeito, fuga das aulas remotas nas plataformas virtuais, nenhuma leitura, pouquíssima escrita, práticas seletivas de exclusão de matérias específicas e direcionamento para as quais vão se dedicar, copia e cola da internet sem qualquer aprendizado ou construção de sentido ou a omissão completa desde que, ao final do segundo ano letivo seguido durante a pandemia possa constar no sistema a palavra "aprovado/a". E pouco importa se presencial ou remota, pois a escola e a educação não lhes interessam de fato. Quem vai responder por isso?

            Professores e professoras, funcionários públicos da educação de um modo geral, seguimos sem aumento, reajuste sequer das perdas inflacionárias e/ou decorrentes da não correção de alíquotas fiscais. Antes, temos convivido com perdas salariais, aumento obrigatório do valor de descontos em nossos salários, condições precárias de trabalho, assédio moral, falta de autonomia e respeito à liberdade de ensino, desvalorização, desrespeito e retaliações contínuas.  Nossos colegas de firmas terceirizadas que prestam serviços são demitidos sem qualquer amparo às centenas, ou seus baixíssimos salários são pagos com atraso e descontos inexplicáveis que os colocam abaixo do piso mínimo determinado pela Constituição.  

            Nesse exato momento, em mais de 50 municípios do Estado do Rio de Janeiro, a política do disfarce da incompetência do governador e de seu secretário de educação dá curso a um Rio de contaminação, morte e assédio moral contra servidores e servidoras e principalmente contra a vida de alunos e alunas e das pessoas em seu entorno, através da reabertura das escolas estaduais nesses municípios. 510.000 mortos de Covid em um ano e meio não ensinou nada a essas pessoas. Nem despertou qualquer empatia em seus corações ou temor pela justiça se ou quando ela vier.

 

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