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Poeta - escritor - cronista - produtor cultural. Professor de Português e Literaturas. Especialista em Estudos Literários pela FEUC. Especialista em Literaturas Portuguesa e Africanas pela Faculdade de Letras da UFRJ. Mestre e Doutor em Literatura Portuguesa pela UFRJ. Nascido em Goiás, na cidade de Rio Verde. Casado. Pai de três filhos.

sexta-feira, 9 de outubro de 2020

Poema: "Raso", de Erivelto Reis

 

Raso

Erivelto Reis

 

Descobri tardiamente:

Os sentimentos verdadeiros não sabem nadar.

Não aprenderam nunca, não lhes foi ensinado

A sobreviverem ante o desespero...

Não sabem a diferença entre aprofundar e afundar.

Logo soçobram, sucumbem

Às marolas, às ondas, às imensidades e insensibilidades,

São criaturas antiaquáticas frágeis.

As correntezas os arrastam e não deixam

Que se fixem às pedras da afetividade humana.

 

Seu movimento não vai gerar energia,

Muito ao contrário, a conta é alta,

O desperdício é enorme.

Para que gere alguma força

Apenas à luz do sol, da arte e da energia eólica...

Talvez seja possível simular com rum, com gim, com vodka...

E se o sentimento é ruim, toda luz que tenha é prejuízo.

 

Os sentimentos não sabem nadar,

Nem há quem os possa ensinar.

Na verdade, se afogam em qualquer superfície,

Rasa que seja,

Em que não sejam notados, valorizados,

Submergem os bons sentimentos e os maus, também,

Sendo que estes, desesperados,

Agarram-se aos bons, que lutam

Para permanecer em não-naufrágio ao seu lado

E os levam, como âncoras, acorrentados

Paro o fundo do rios, do oceanos, do lagos...

 

Dias depois, quase invisíveis a olho nu (s),

Seus corpos chegam à praia mutilados,

Magoados, faltando partes vitais.

Coisa horrível de se fingir não ver

É sentimento em estado de decomposição.

Dirão: “ah, mas os sentimentos novos nascem,

Brotam sem explicação!”

Escandaloso argumento que culpa a vítima

Por escolher alguém, erguer uma casa, molhar os pés na água,

Por (pra não morrer) implorar ajuda...

 

Sentimentos não sabem nadar:

São vítimas camonianas do naufrágio

Quando o afeto afunda.

Não é mergulho, que isso é especialidade do sonho e da esperança,

Que são espécies evoluídas de sentimento...

Estes morrem, também, no ar, no amar, no asfalto,

E não há salva-vidas que dê conta quando se erra o salto.

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